8.3.04

Anos II (3 dias depois)

Pensei que chegar aqui fosse mais difícil, há tempos que consumo o espírito desejando que esta data tardasse a chegar. Imaginava o calendário a saltar o dia, sem traços que marcassem uma chegada indesejada. Não por ingratidão, mas porque há números que marcam, que nos fazem pensar, que nos fazem crer que tudo mudou. A outra escala foi o que se passou aos 18. Mas esta vez avizinhava-se mais dura, e foi, sendo que apesar de tudo foi muito melhor do que o esperado.
Sabemos que números nada dizem, que a idade, a verdadeira idade, permanece encerrada no espírito. Ainda assim custa, custa mudar de dezena, custa passar a um clube do qual não nos sentimos membros. A sensação é a de entrar numa festa sem ter sido convidado, sentimo-nos desconfortáveis, fora do "habitat".
Irrita-me saber que alguns disparates que faço, e espero continuar a fazer, sejam agora apontados como de outras idades, irrita-me que as roupas que visto sejam censuradas por questões etárias. No fundo é isto que custa porque a minha postura será exactamente a mesma.
Um problema supera os anteriores, o tempo jovem que sentimos não ter vivido, as coisas que queríamos ter feito, a sensação do tempo nos fugir das mãos como água. A vontade de voltar atrás, não para mudar as coisas, mas sim para as viver ainda mais, e ir mais além.
A idade não nos faz sentir velhos, mas há coisas que o fazem e muito. Já não falo da capacidade para aguentar um jogo de futebol ou outro exercício físico. Falo da constatação de haver depois de nós uma outra geração, ou mesmo outras. Gente que não vibrou com o "Verano Azul" assobiando em grupo a sua canção; que não esperava ansiosa pelos desenhos animados que o Vasco Granja nos trazia, chorando quando eles eram Checos ou Polacos; que o primeiro computador que teve não foi, seguramente, o Spectrum 48K, do qual nem sabe a existência; que liga Sá Carneiro só e apenas a Camarate; que não sabe que a Lois foi objecto de desejo há alguns anos e que os All Stars não são uma criação moderna.
Esta sensação de A Geração já não ser a nossa leva-nos a pensar que o mundo nos está a passar ao lado, e dou por mim a ter vontade de dizer o que sempre odiei ouvir: "no meu tempo é que era". Espero não o fazer, acho que não o vou fazer, afinal a resignação é uma virtude e eu vou tentando, com dificuldade, ser minimamente virtuoso.

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