28.12.06

Término

A gélida tranquilidade provinciana é o essencial ponto final de mais um ano.

Noite de Natal

Passado o jantar e o caos habitual do desembrulhar de presentes, lá chegaram as crianças para um teatro. Nesta altura é normal ir buscar gelo ou servir mais um Whiskey, só que este ano o improviso e o curto ensaio geraram um mui inventivo circo com sentido de humor britânico que não lhes conhecia. Uma pura delícia em que os aplausos não foram acompanhados dos habituais sorrisos amarelos de condescendência, mas sim de estridentes e sonoras gargalhadas. A coisa foi tal que, talvez ajudados pelo vinho, alguns adultos se encheram de brios, recuando a uma distante infância e recriando músicas e danças antigas. Foram momentos de ouro, em que circunspectos e reservados senhores, e senhoras, desfilaram em filinha a cantar a música do seu jardim-escola ou a canção das “três maninhas” da qual, surpreendentemente, ainda se lembravam da letra. Esta noite poderia ser banal noutras casas, na minha, feita de gente por norma tímida e discreta, foi surpresa e bem agradável. Afinal, o Natal é isto mesmo, alegria entre amigos e família. Lá fora estava muito frio, cá dentro a temperatura inesperadamente subiu por inteira responsabilidade das crianças que tendemos a desvalorizar, mas que, por vezes, nos demonstram cabalmente o disparate desta atitude.

20.12.06

Música de Natal

Nada me faz mais lembrar o Natal das noites frias e das neves sonhadas do que Sinatra. O Natal passado a ver filmes a preto e branco de outros tempos, mas de todos os tempos, como anual revisitação de “Do céu caiu uma estrela” ou outro Capra que, com o seu optimismo, nos enchia de espírito reconciliador. Por isso fica aqui ao lado para ouvir, tirado do disco “Sinatra Rarities – The CBS Years”, “Nature Boy”, uma eterna canção cuja letra se pode, em muito, aplicar ao período do ano em que estamos.

There was a boy, a very strange enchanted boy
They say he wandered very far, very far, over land and sea
A little shy and sad of eye, but very wise was he
And then one day, a magic day he passed my way
And while we spoke of many things, fools and kings
This he said to me: "The greatest thing you'll ever learn
Is just to love and be loved in return"

Definição do dia

ERC – Censura do século XXI em que o lápis azul é substituído por comunicados imperceptíveis e ofensivos.

18.12.06

Ironias

O concurso para a gestão do Rivoli foi ganho por Filipe La Féria. Não deixa de um enorme gozo imaginar a fúria desesperada dos okupas ao verem o teatro entregue a quem mais tem feito pelo teatro comercial que eles tanto abominam. Não sou particular apreciador do estilo La Féria, agora que tem uma digna qualidade e tem feito mais pelo teatro em Portugal do que muitos obscuros grupos de vão de escada, isto é um facto. Ainda assim o mais importante é que o faz com o seu próprio dinheiro, empenhando muitos milhares em super produções sem esperar e reclamar indignado o habitual subsídio do estado. Pessoas com esta iniciativa e risco próprios, sem a rede do Estado a amparar desvarios, merecem ser reconhecidas, independentemente de gostarmos ou não do seu estilo.

Definição do dia

TLEBS – Masturbação intelectual de linguistas, perpetrada com um total desconhecimento da realidade e encarando as crianças como simples cobaias.

Advento

Porque ás vezes apetece roubar palavras:

“Ainda uma nota mais sobre o dia de Natal que se aproxima: lamento profundamente que a mensagem subjacente ao nascimento do nosso Senhor, do Rei dos reis, Deus feito homem, tão equivocamente tenha vingado em dois mil anos de catequização. Que o Salvador afinal nasce gloriosamente pobre e indefeso numa manjedoura, numa nação ocupada e reprimida... Que a mais fantástica e bela história do mundo indica-nos inequivocamente um caminho de libertação e de felicidade, justamente na entrega, e não na conquista. No dar e não no receber. E que a redenção se conquista em tudo ao contrário do que ensurdecedoramente nos “vendem” por todo os recantos desta civilização decadente. E que é ao libertarmo-nos do nosso sôfrego e deprimente umbigo que podemos alguma vez realizarmo-nos como homens livres. E que o nosso coração frio e egoísta é a imagem das albergarias de Belém quando se fecharam a Maria e José em vésperas do Grande Acontecimento. E que se vivermos o Natal de Jesus, nem que seja por um dia, seremos indubitavelmente melhores pessoas e mais felizes.Assim Deus me ajude a viver este Natal.”

João Távora in Corta-fitas

17.12.06

Natal em Lisboa

Que agradável pode ser Lisboa. A tarde ontem passada por entre o Chiado e a Baixa foi disso exemplo. Ainda que faltem comprar alguns presentes, que bom foi passear sem destino pelo real centro de Lisboa, no meio do bulício das gentes em compras de Natal. Percorrer a Baixa – onde o povo circula e compra – à conversa, divagando sobre a decadência da nossa capital, discutindo o que é, ou não, patine, parando em locais emblemáticos, como o Hospital das Bonecas ou a Tendinha, ou em lojas extraídas de filmes neo-realistas dos anos sessenta. Subir ao Chiado, como que trepando na pirâmide social, onde gentes de porte aristocrático deambulam pela Rua Garret. Acabar com um lanche no Chá do Carmo, com um sempre delicioso “Thé de Noël” da Mariage Frères acompanhado de uma torradinha e de um scone com manteiga e compota de chá Marco Pólo (também da Mariage Frères). Que coisa boa, assim como a conversa longa, ao abrigo do frio que chegou com o por do sol.

Essencial

A entrevista de Miguel Esteves Cardoso no Diário de Notícias de sexta-feira (suplemento 6ª).

Petição

Nos links aqui do lado, na secção “e agora…”, pode o leitor aproveitar para assinar a petição contra a irresponsável e idiota TLEBS. A bem deste país e da sanidade mental dos portugueses.

15.12.06

Corrupções

Parece-me bem a nomeação de Maria José Morgado para dirigir a investigação do processo “Apito Dourado”. Não simpatizo, de todo, com a senhora enquanto figura pública, acho-a mesmo bastante desagradável, mas transmite um certa ideia de fibra e incorruptibilidade que é essencial para o processo em causa. Apenas quem acredita no Pai Natal acredita que não há corrupção no futebol português, vamos ver se é desta que “essa gente” é punida pela lei.

12.12.06

Lisboa

O debate de ontem fez-me ter vontade de ser mosca e assistir ás sessões da Câmara de Lisboa. De um lado, Carmona Rodrigues, do outro, quais tias à mesa de chá, Maria José Nogueira Pinto, José Sá Fernandes e Ruben Carvalho. Tudo muito animado, mas cordial, como deve ser, sem insultos nem tontarias. Ganha Lisboa? Talvez não, porque quem manda é Carmona que na prática não tem mostrado o bom senso que aparenta quando fala. Também não será grave, pelo menos não foram ouvidas propostas estonteantes “à la Santana”. Estava mais um senhor na mesa que parecia estar fora de tudo, quer dos assuntos em discussão, quer da familiaridade divertida dos restantes. A política não tem de ser terra de insultos, pode haver discordância firme sem roçar o insulto e a provocação barata. O senhor do canto ainda não percebeu isto, aliás, nunca o irá perceber e ainda bem, assim não correremos o risco de o ver eleito para qualquer cargo de poder.

Ditaduras

A morte de Pinochet trouxe de novo à baila a idiota discussão entre ditadores de direita e de esquerda. Caso para voltar a dizer que um ditador é um ditador, é um ditador, é um ditador.

11.12.06

5.12.06

Açoites

Açoitar será pouco, talvez umas chicotadas polvilhadas com sal sejam mais adequadas para os energúmenos que teimam em deseducar as nossas crianças, criando um ensino absurdo e monstruoso. A propósito da TELBS, como é óbvio.

.

“Ai, Portugal, Portugal
Enquanto ficares à espera
Ninguém te vem ajudar”

Jorge Palma, “Portugal, Portugal”

4.12.06

Delírios

O PS parece querer lançar Jorge Coelho como próximo candidato à Câmara Municipal de Lisboa. Só faltava acrescentar a recandidatura de Santana Lopes para ficarmos com a certeza de que o caos se iria instalar. Coelho augura tudo de mau, pelo menos para quem se lembre das suas excelentes relações com os construtores civis, típicas de quem se arrastou durante anos nas funções de angariação de dinheiro para o partido. Adivinho já o slogan “Lisboa não pode esperar”, revelando a enorme necessidade de construir e de “fazer obra” na cidade. Teme-se o pior, mas esperemos que não se concretize e que a direita acorde e deixe de se comportar como uma criança mimada e irresponsável.

1.12.06

Comemoração e Pessimismo


Corria o ano de 1640 quando um grupo de conjurados se juntou para expulsar os espanhóis do território português. Era a independência, a soberana e livre independência que hoje se comemora. Passados tantos anos será que somos dignos dela? Será que somos ainda um país livre, soberano e independente?

29.11.06

Camarate

A anunciada confissão de José Esteves pouco adianta sobre o caso Camarate. Há muitos anos que é definitiva a sensação de que tudo foi feito para que nada fosse descoberto. Teoria de conspiração? Não o creio, são demasiados os indícios de obstrução para que sejam apenas uma coincidência usada para reclamar justiça. Portugal não é um país justo e, infelizmente, o problema não vem de hoje, vem de há mais de vinte anos. As inúmeras comissões de inquérito terão sido um part-time para deputados com pouco para fazer. Os responsáveis serão uma vez mais um grupo de desconhecidos e, como diz o povo, a culpa morre solteira. Fica a óbvia revolta por viver num país assim, em que a impunidade alastra dos criminosos de facto até aos criminosos por conivência que nos governaram e governam.

Uff!

Cantemos aleluia por um dia de sol que alivia as depressões aquosas.

28.11.06

E a 25 de Novembro

Começou o 31.

Colecções

A colecção de Manuel de Brito (o falecido dono da Galeria 111) vai estar exposta ao público no Palácio Anjos em Algés. A família, herdeira da colecção, cedeu a mesma ao município de Oeiras por um período renovável de onze anos. O projecto e as obras de adaptação do palácio foram da responsabilidade de autarquia. Será impressão minha ou detecto alguma (saudável) diferença em relação à colecção Berardo?

24.11.06

Dia Imaginário

Arrasto-me até ao armário onde desencanto uma mantinha de lã. Corro à cozinha onde a água está quase a ferver, e deixo-a cair suavemente para dentro de um bule, previamente escaldado, sobre um infusor com chá verde. Transporto com cuidado o tabuleiro até uma pequena mesa ao lado do confortável sofá. Ponho a tocar Sinatra, com a orquestra de Tommy Dorsey, e sento-me resolutamente, sem intenções de me levantar, com um livro de Waugh ao lado. À frente o fogo consome a lenha na lareira. Chega Charles e pergunta o que quero para o lanche e o jantar, sendo a minha resposta vaga e desinteressada. Hoje, o que interessa mesmo é aproveitar o temporal para me recolher na minha cápsula, Charles sabe como a tornar cómoda até ao limite do insuportável.

23.11.06

Tarde Em Itapuã


Para não esquecer a música muito cá de casa, aqui vai Vinicius de Moraes em concerto com Miucha, Tom Jobim e Toquinho. Apesar de estar a ser filmado para a televisão, a ideia de uma informal noite entre amigos está presente na garrafa de Whisky que se vai esvaziando ao ritmo da Bossa Nova. Além de um grande poeta, que bela companhia para uma noite de copos seria Vinicius.

22.11.06

CCB

Entra a Colecção Berardo, após infame e ruinoso contrato assinado pelo Estado, e sai a Festa da Música por falta de verba. Será mesmo necessário comentar?

21.11.06

Coisas Divertidas

Apesar de ser “intelectualmente incorrecto”, confesso que ontem fui assistir a um concerto do José Cid no Casino de Lisboa. Mais incorrecto ainda será dizer que foi um óptimo concerto e que me diverti como em muito poucos concertos que me lembre. Para além da qualidade de algumas músicas – sim, não é erro, acho que são mesmo boas e não falo, como é óbvio, do “Macaco gosta de banana” nem das “Favas com chouriço” – é sempre divertido estar num concerto em que o público – que atravessava gerações e classes sociais – conhecia e cantava todas as músicas, como se as mesmas fizessem – e se calhar até fazem – parte das suas vidas. Eu gostei e diverti-me, e ponto.

The Departed – Entre Inimigos

Por estas bandas gostou-se muito do último Scorsese, The Departed – Entre Inimigos, confirmando que há realizadores que não sabem fazer maus filmes e que, de uma maneira geral, teimam em os fazer excelentes. Tudo aquilo em que Scorsese é mestre está presente neste filme: argumento sólido, realização sublime, montagem sem erros, música que é parte integrante das imagens (belíssima versão de “Confortably Numb” cantada por Roger Waters e Van Morrison.). Essencial ao brilhante resultado final é também o trabalho dos actores que, neste caso, está ao nível da realização: Leonardo Di Caprio está magnífico e poderoso, com uma contenção sempre pronta a explodir que lembra em muito o James Dean de “Fúria de Viver”; Jack Nicholson constrói mais um momento vintage, em que não cede, como por vezes já o fez, ao overacting e domina o filme do princípio ao fim; Mark Whalberg é perfeito num pequeno, mas delicioso e importante, papel secundário; e no meio de tantos homens surge Vera Farmiga, com uma serenidade que escorre dos seus olhos cor de água e inunda todo o filme, representando alguma normalidade no meio de tanto desequilíbrio e violência. A sua personagem é uma réstia de bom senso num mundo alucinado e é elemento chave para a compreensão de toda a densidade emocional que Scorsese apresenta, sem ceder, como é seu hábito, a moralismos fáceis.

Agradecimentos

Ao Pedro Sette Câmara que fez, n’ “O Indivíduo”, o primeiro link internacional, via Brasil, para este blog.

20.11.06

Lisboa

As comadres zangaram-se em Lisboa e a coligação foi desfeita. Os motivos foram os melhores, ou seja, desavenças em nomeações para uns tachos quaisquer. Será preciso qualificar esta gente? Carmona – ou bastião da moralidade, como se apresentou nas eleições –parece que afinal é apenas uma marioneta do aparelho do PSD que, estando fora do governo, parece ter dificuldade em colocar os seus “boys”. Nada que espante muito, o que espantará mais são as mensagens já passadas de que a câmara ficará ingovernável e que, salvo consigam pescar o socialista descontente, poderemos ter eleições antecipadas! Ao que parece as minorias são um incómodo para esta gente e o simples facto de terem de governar sem poder absoluto é algo de indigno e impensável. Resumindo, ou teremos um “queijo limiano” por parte do socialista que, compreensivelmente, se incompatibilizou com Carrilho, ou as eleições poderão ser uma realidade. Seria uma animação, nestes aborrecidos tempos que o país atravessa, mas também seria uma irresponsabilidade enorme para a governação da cidade de Lisboa, que pararia durante algum tempo como que fechando para balanço.

16.11.06

Isto promete!



A julgar pelos excelentes vídeos promocionais, e pelo elenco, este parece ser um “filme” recomendável. Esperemos pela estreia que, ao que parece, será dia 25 de Novembro.

15.11.06

O disparate do Marquês

O famoso túnel que Santana Lopes sonhou para Lisboa tornou-se mais um exemplo perfeito das obras públicas em Portugal. Após adjudicação directa, as obras começaram em Agosto de 2003, com um prazo de 61 semanas para a sua conclusão. Estamos em Novembro de 2007, e nem os sete meses de atraso devido à providência cautelar interposta por José Sá Fernandes justificam que a data prevista para o fim da obra seja de Março de 2007. Fim este que é parcial, uma vez que a saída para a António Augusto de Aguiar ainda vai ficar à espera da conclusão de obras de reparação de fissuras na linha amarela do Metro, no local em os túneis distam imensos cinco centímetros.
Durante todo este atraso ganhou Lisboa um magnífico estaleiro e um trânsito ainda mais caótico na zona do Marquês. Da derrapagem orçamental nem vale a pena falar, são os incontáveis milhões que vão alimentando a construção civil deste país à custa dos contribuintes. Tudo isto se passa e a impunidade continua. Enfim, é o país que temos.

13.11.06

Democracias

Ontem, dei por mim a dizer bem do secretário-geral do PS. Estranho, especialmente tendo em conta que o fiz a propósito de o mesmo confirmar que, independentemente de o referendo ser vinculativo, a despenalização do aborto só acorrerá se o “Sim” ganhar. A decisão é tão óbvia e do mais puro bom senso que nem devia ser motivo de regozijo. Afinal, para que serviria este referendo se assim não fosse? A partir do momento em que foi feito o primeiro referendo, é democraticamente óbvio que a lei só pode ser alterada após aprovação por outro referendo. Claro que a arquitecta Helena Roseta, num desvario estalinista, acha o contrário, mostrando que os paladinos da esquerda mais dura continuam com uma visão da democracia no mínimo estranha.

Coisas da Vida Boa

Uns copos de água-pé por entre as brumas do fumo das castanhas.

8.11.06

Coisas do Tempo

O Outono chuvoso levou nas águas a cor de areia estival do template. Voltamos assim ao negro original, mais digno da sobriedade da estação.

Versões

Aqui ao lado passamos a ter “Ne me quitte pas” em duas versões bem diferentes: Nina Simone com sua delirante versão já muito falada no Impensável e Ute Lemper no estilo cabaret berlinense.

Links

A blogosfera sempre em movimento levou a actualizar os links deste blog.

7.11.06

Esquerdas

Saddam Hussein foi condenado à morte por enforcamento após julgamento segundo as leis iranianas. Entre a defesa dos direitos humanos e a persistente compreensão pela cultura árabe, a esquerda ficou hesitante.

6.11.06

A Havaneza

Ao longo da vida há sítios por onde passamos que se tornam parte integrante de nós. A mercearia onde comprávamos rebuçados em criança, o quiosque onde íamos ao jornal com os nossos pais, o café onde lanchávamos com as nossas avós. Todos teremos memórias de sítios essenciais, sejam de memórias de infância, sejam de momentos mais recentes. Este fim-de-semana chegaram notícias tristes da Figueira: a Casa Havaneza estava de porta fechada. Um papel dizia que reabriria, mas após os boatos de Agosto, acerca da mudança de dono, são poucas as esperanças de que tudo fique na mesma.
A Havaneza era uma livraria à antiga, onde podíamos comprar jornais e revistas, canetas e cigarros, postais e, claro, livros. A definição “comércio tradicional” não se poderia aplicar de melhor forma. Não falamos de uma loja que valia só pelos seus produtos, mas de uma instituição cuja importância se estendia a quem nos acolhia por detrás do balcão. Há lojas onde vamos com o propósito já definido de comprar algo, mas outras há onde vamos, simplesmente vamos, para ver o que há, para estar. As idas à Havaneza não tinham de ter um fim ou uma lógica, por vezes eram passagens para ver as novidades na montra sempre em mudança, outras, entradas para ver as revistas que tinham saído ou se tinha chegado o livro que tínhamos perguntado se havia e que estava a caminho. Como esquecer as capas de papel pardo com o nome gravado que cobriam os livros para poder levar para a praia sem estragar. Como esquecer os belíssimos marcadores de livros com fotografias antigas da Figueira, ou a edição de postais com essas e outras fotografias doutros tempos desta praia. Como esquecer a sua esquina e as suas montras, as janelas azuis, a placa encarnada de latão, o letreiro comemorativo dos cem anos de casa.
Pode a Havaneza reabrir, mas será decerto outra Havaneza, em que a senhora D. Helena não estará por trás do balcão com a sua simpatia difícil de conquistar, esperando a passagem de amigos, clientes antigos, ou novos clientes cujo interesse a fizesse levantar e dar dois dedos de conversa. A Havaneza não era uma loja fácil, onde éramos acolhidos por empregados ignorantes e falsamente simpáticos que nos bajulam desnecessariamente, na Havaneza os clientes eram bem tratados, mas com um educado distanciamento só vencido pela repetição, pelo interesse. A Havaneza era desorganizada e pouco prática, mas esse era também o seu charme, e também o motivo porque encontrávamos sempre um livro interessante que não procurávamos.
A Casa Havanesa era património da Figueira, ou ao menos deveria ser. A “minha“ Figueira é, era, indissociável da Havaneza, como o era de mais alguns sítios que tristemente já desapareceram. Talvez seja excesso de conservadorismo, talvez seja um ataque de nostalgia num escuro dia de Outono, o certo é que a Figueira que me fez feliz já só existe na praia e nas pessoas. Tudo em redor foi sacrificado a um pretenso progresso.
Como disse um amigo, com os seus pequenos exageros, parece que se foi alguém de família. Não diria tanto, mas por certo que se foi algo de meu.

3.11.06

Coisas que irritam

Abrir um blogue e ser automaticamente fulminado por música, obrigando-nos a dar um desagradável salto da cadeira.

31.10.06

Aborto (questões avulsas)

Quando ainda faltará algum tempo para o referendo, a discussão sobre o aborto já começou. Ontem foi um “Prós e Contras” demasiado animado, na blogsfera já se escreve sobre o assunto em muitos blogs e até já há blogs consagrados ao assunto.
A discussão deriva sempre, e em demasia, para pontos acessórios, escapando ás questões essenciais que este assunto levanta. O que está, de facto, em causa? Uma lei que vai ser referendada e se a seguinte pergunta vai, ou não, ser aprovada:
“Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras 10 semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?”
Sobre isto ficam algumas questões no ar:

– O que é a “opção da mulher”? É a escolha entre um aborto gratuito e uma maternidade sem aconselhamento médico e psicológico, sem outras opções para além do aborto? Será apenas isso? O aborto é assim considerado um fim per si, que assume uma desresponsabilização do Estado no apoio à maternidade. Haverá opção real sem soluções alternativas?

– O que entende o PS por despenalizar? Depreendo que seja impedir as mulheres de serem acusadas por abortarem. E o que se passa com as clínicas abortivas, se não são penalizadas passam a ser legais?

– Porquê dez semanas? É de facto diferente uma mulher que aborta ás nove semanas e meia daquela que aborta ás dez semanas e meia? Se não há qualquer base científica para estabelecer este limite, porque é que ele existe? Convém clarificar se passamos a ter um crime sem pena até ás 10 semanas, que no espaço de um dia passa a ser penalizado?

– O que se vai passar com as mulheres que abortem fora de tempo? Quem vai fiscalizar os médicos que fazem abortos para verificar se as semanas são cumpridas? Vai haver uma “brigada das semanas”? É que se é estabelecido um limite numa lei que é suposto resolver um problema, esse limite será para cumprir integralmente, doa a quem doer. Serão as mulheres realmente presas? A questão é tão mais pertinente quanto nos, poucos, casos levados até hoje a julgamento, que contaram com grande contestação dos adeptos do “Sim”, as mulheres em causa abortaram fora do prazo que pretendem legalizar.

– “…em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?” Privado ou público? Se for privado não dá resposta ao discurso neo-realista das mulheres pobres e desgraçadas, pois elas terão de pagar para recorrer a este serviços. Se for público teremos um grave problema no país. Portugal tem um sistema nacional de saúde a rebentar pelas costuras e sem dinheiro, onde há filas de espera para consultas e operações. Se o aborto vier a ser feito em hospitais públicos, das duas uma, ou passa à frente (por causa das dez semanas) podendo impedir actos médicos que salvem vidas humanas, ou então espera e passa o tempo legal. Como prevê o Ministro da Saúde resolver este problema?

– Os hospitais públicos são pagos pelo contribuinte, ou seja, os impostos virão a ser utilizados para efectuar abortos. Concluímos que o Estado irá pagar para matar?

30.10.06

Elogio do Silêncio

(a propos de “Into Great Silence”, de Philip Gröning, exibido sexta-feira no DocLisboa)

A deslocação a um cinema para ver um documentário de cerca de três horas sobre a vida monástica dos cartuxos (a ordem de clausura com regras mais ascéticas) – filmado com som ambiente, luz natural e sem equipa técnica, que não o realizador, segundo regras estabelecidas pelo abade para, dezasseis anos após o pedido de Gröning, autorizar a entrada na Cartuxa – é experiência radical a que não aconselharia noventa por cento dos meus amigos. Tudo levava a imaginar um filme chatíssimo, e apenas uma conjugação de interesse artístico e religioso me levou aceitar a experiência. Sim, a experiência, porque é disso que o filme trata. A experiência de partilhar uma forma de vida exótica perante os padrões de vida de hoje em dia. Mais do que “entrar” no silêncio, entramos num mundo paralelo em que o tempo é conceito diferente, regrado e repetitivo, mas tranquilo.
A clausura sempre foi uma manifestação de fé que tinha grande dificuldade em compreender. O que levaria um ser humano livre a deixar-se reger por um regime de vida profundamente ascético e que tornava a sua existência um mero ritual repetitivo de oração? Porque motivo alguém escolhe, no mundo de hoje em que as liberdades são conhecidas por (quase) todos, uma vida em que o mundo é apenas uma existência física para lá de muros e paredes? O filme não procura esta resposta, como aliás não procura nenhuma resposta, seguindo o rigor jornalístico na forma com se “limita” a mostrar uma vivência, uma opção de vida, sem um julgamento moral ou social. Gröning não nos diz que esta reclusão, ou qualquer outra reclusão, é boa ou má, aceitável ou não, apenas nos mostra com crueza e rigor como é vivida essa reclusão. Claro que observar como é a vida de clausura nos permite ter o nosso próprio julgamento, não condicionado por ideias veiculadas no filme, mas sim pelo nosso julgamento perante a realidade que nos é mostrada. Ao ver como é a vida destes monges, consigo melhor perceber que assim consigam viver.
O silêncio é algo de que tendemos a esquecer o valor. Quantas vezes poderemos dizer que estamos, de facto, em silêncio? Hoje, a sociedade associa o silêncio à solidão, à tristeza, a uma fuga da realidade cada vez mais barulhenta e feérica, a uma fuga do mundo. Acredito que isto se passe em cada monge que escolheu a vida da Cartuxa, apenas um factor não é semelhante, para eles o seu mundo não é o nosso mundo vulgar e comezinho, o seu mundo é o espiritual, e o “nosso” é apenas suporte físico intermédio numa relação permanente com o divino.
Será a clausura necessária para alguém poder dedicar a sua vida a Deus? Não creio, mas é uma forma como qualquer outra para alguém se encontrar consigo próprio e com o divino. Não será tão exótica esta opção de vida radical como será a dos hippies ou dos ciganos nómadas? Cada vez mais a sociedade nos manipula a acolher diferenças que se tornam politicamente correctas e que acabamos por ter de aceitar, porque não aceitar que alguém queira simplesmente ter o seu mundo sem incomodar ninguém?
Cinematograficamente o filme é interessantíssimo, pois mostra o enorme talento de Gröning para filmar em condições mais do que complicadas. Ele não podia utilizar as técnicas habituais, a sua câmara teria de ser crua e discreta, simples e sem artifícios. A beleza estética que resulta das imagens é impressionante, e há planos inesquecíveis, tais como as orações nocturnas acompanhadas por cantos gregorianos ou os primeiros planos frontais dos monges. Não obstante, o mais notável no filme é a forma como o mesmo é montado e com isso consegue criar uma lógica argumentativa. A montagem consegue tornar o filme surpreendentemente ritmado, criando uma série repetitiva de tempos, nunca fechada, permanente. A sequência de imagens alterna imagens da vivência dos monges – rezando, comendo, cantando – com a natureza em redor – com a maravilhosa natureza em redor e as suas montanhas cobertas de neves ou ribeiros correndo na primavera. Gröning consegue, através de uma brilhante realização e de uma fabulosa montagem, criar uma quase-hipnose ao longo do filme da qual apenas somos despertados quando as luzes se acendem. No final do filme, a sensação é a de que de facto estivemos na “Grande Chartreuse” por tempo indefinido, há um tempo indefinido. Enquanto o filme dura esquecemos o mundo, o nosso mundo, e compartilhamos a experiência de espiritualidade vivida pela oração, por uma vida de constante oração.

Amadorismos

Como será possível que, num festival internacional de cinema (DocLisboa), um filme (Into Great Silence) passe com um enquadramento maior do que o ecrã que capta a imagem projectada e que, pior ainda, durante uns dez minutos tivesse o enquadramento deslocado em um terço para fora do ecrã! Numa sala de cinema do Colombo protestaríamos, mas ainda poderíamos desculpar, agora num festival de cinema…só mesmo em Portugal.

26.10.06

Diálogos Imaginários

– Charles, tenho a cabeça feita em água. Já não sei o que vista, com a chuva inclemente e esta temperatura difícil de perceber.
– Menino, acho que isso se poderá resolver. Vou buscar os seus casacos impermeáveis e sapatos adequados, mas acho que ainda será excessivo para camisolas.
– Já não sei nada, Charles. Já não há estações calmas e previsíveis como antigamente.

25.10.06

Estações

Ontem à noite senti falta de uma vela, ou de uns remos, enquanto atravessava o rio da segunda circular. Ainda olhei, por entre o dilúvio, em busca de umas carpas saltitantes. Apenas água, e muita, por todo o lado.

Plágio

Anda por aí um grande bruá por causa do suposto plágio de Miguel Sousa Tavares. Apesar de ter lido o livro, de que aliás gostei, não me interessa muito a factualidade de haver, ou não, plágio. O livro em questão, um romance histórico, mostra a bibliografia de consulta onde consta o livro supostamente plagiado. Como tenho Miguel Sousa Tavares como uma pessoa inteligente, e muito acima da média em tudo o que não esteja relacionado com futebol, acho que a burrice de fazer um plágio descarado de uma obra citada não é coisa dele.

24.10.06

Filmes do País

O governo, sempre tão atento ás coisas modernas, estranhamente ainda não se lembrou de contactar M. Night Shyamalan, conhecido realizador de cinema, para se deslocar a Portugal. Seria uma importante operação com vista à cedência de direitos de algumas histórias passadas no nosso país, com a contrapartida de as mesmas serem filmadas por cá. Ao chegar, por certo que o realizador resolveria mudar-se por tempo indeterminado, ao descobrir um filão de histórias, tão ao seu gosto, em que as mais improváveis coisas parecem ter força e vida próprias. Vejamos:

1 – Há uma ponte que resolve cair. Não por que uma tempestade devastadora, com furacões seguidos de tremores de terra, pesasse sobre ela, apenas porque sim, porque terá ganho vida própria e, por qualquer motivo, lhe apeteceu. O seu estado de conservação era excelente e ninguém tinha elementos que lhe permitissem desconfiar que ia cair. Apenas caiu.

2 – Há um túnel do metropolitano que é previsto para uma zona ribeirinha. O projecto e a obra são exemplares e têm em conta todas as especificidades de subsolo da zona do em causa. Estranhamente, parece que o túnel ganha vida própria e insiste em não querer ser concluído. Mete água, faz deslizar a terra à sua volta, e deixa perplexos os projectistas, os construtores e os donos de obra. Há quem questione maldições relacionadas com naus afundadas nas redondezas, certo é que os anos passam e em seu redor continua um magnífico estaleiro sobre o rio.

3 – Um túnel de provecta idade chegou a um tal estado de degradação que necessitava, por razões de segurança, de obras. Tudo se acerta e estabelece-se que a obra durará um ano, durante o qual o túnel será encerrado. Passado esse tempo sabe-se que a obra quase não avançou e demorará mais algum tempo. O motivo parece ser a presença de um fantasma do Adamastor que teima em não deixar que as modernices entrem no túnel e lhe levem a patine adquirida ao longo dos anos.

Na forja:
4 – Crianças de uma instituição estatal são comprovadamente abusadas. O processo arrasta-se em tribunal e ninguém é condenado. Fica um mistério assustador: que estranho ser terá abusado repetidamente das crianças desaparecendo posteriormente sem deixar rasto?

5 – O futebol do país treme com um enorme processo de corrupção que atinge muitas das maiores figuras do meio. São tornadas públicas escutas claramente comprometedoras. O processo é arquivado perante a estupefacção geral. Um conhecido imitador é preso por obstrução à justiça e desrespeito pela autoridade, negando veementemente todas as acusações. Quem terá sido o maléfico criador de todo este processo sobrenatural?

21.10.06

Adivinha

Qual é coisa qual é ela que está disponível para comprar a tempo de se ler mesmo antes de nascer?






A resposta é o Sol, o único jornal já nas bancas ás cinco e meia da manhã de ontem.

Promessas

Apesar de ter passado a campanha eleitoral com um cuidado asséptico em não se manchar com promessas, o primeiro-ministro José Pinto de Sousa conseguiu o prodígio de, um ano e meio passado, conseguir quebrar a grande e veemente promessa de não admitir portagens nas SCUT. Os jornais e a opinião pública espantam-se e indignam-se com facto, esquecendo que o mesmo é (e já era ao tempo da campanha) uma inevitabilidade por motivos económicos. Quanto ás promessas, parece que ainda há quem persista num desmedido optimismo de acreditar nos nossos políticos, claro que serão os mesmos que daqui a dois anos reelegerão o Eng. Pinto de Sousa e o seu PS para mais quatro anos de governo.

20.10.06

Jóias

A questão das jóias portuguesas roubadas na Holanda, já por aqui falada, volta a mexer com uma petição para que, com o dinheiro compensatório, sejam efectuadas cópias dignas do valor do património perdido. Assine aqui.

Versões

Continuando com “Nature Boy”, aqui vão mais duas versões, a mais conhecida, de Nat King Cole, e a de David Bowie para a banda sonora de Moulin Rouge.

Blogosfera

O Insurgente” mudou de endereço e a correcção já foi feita aqui ao lado. 500 000 visitas é um número impressionante que merece parabéns. Aproveito para agradecer a simpática referência ao post anterior.

18.10.06

Ocupação

Seguindo o exemplo dos ocupantes do Rivoli, estou seriamente a pensar juntar uns amigos e ocupar a Casa dos Bicos em protesto com a falta de políticas de conservação e restauro do património português. Aproveitaremos para denunciar o esbanjamento de dinheiros públicos no sustento de obscuros artistas que, ao abrigo de uma suposta vanguarda, se entretêm a levar à cena peças inqualificáveis e das quais a única lembrança que restará será o trauma de quem a elas assistiu. Defenderemos os músicos e os escritores que não conseguindo caçar subsídios, como os colegas do teatro, vão tendo de criar as suas vanguardas a custas próprias e sem apoios do Estado. Denunciaremos também a frenética construção de novos centros culturais e pavilhões multiusos por parte dos municípios, que leva ao abandono de excelentes salas de espectáculos já existentes, servindo apenas para, com o aval do desenvolvimento da cultura, enriquecer, ainda mais, os empreiteiros da zona. Será também ponto de ordem a indignação com a incompetência óbvia da maioria dos nossos cineastas que, tendo escolhido uma arte cara, acham que o Estado é obrigado a financiar os seus caprichos, nomeadamente fazer filmes que nem sequer estreiam ou que ganham prestigiados prémios em festivais de cinema alternativo no Burundi.
A bem da cultura e na revolta invejosa de quem, com grande pena, não é pago pelo Estado para fazer o que gosta. Seria realmente divertido que o Ministério da Cultura me financiasse uma bolsa criativa para estudar as praias do Mediterrâneo, podendo depois levar à cena uma peça minimalista, sem diálogos, com o meu ar de gozo a olhar as fotografias passadas em slide-show no palco ao som de quartetos de cordas de Haydn.

17.10.06

Contradanças

Acabada a época dos casamentos, e passada que está a festa do Lux, tornar-se-á difícil voltar a dançar Frank Sinatra, rodopiando freneticamente pista fora agarrado a um obediente, bonito e ritmado par. Restam sempre jantares caseiros em que a bebida empurre os pés para acompanhar os delírios dos Pink Martini. O Outono chegou com as nas suas brumas e chuvas.

Thanks (to you)

Com as covinhas a aparecer na cara, consequência inevitável de um sorriso, agradeço a quem se deu ao trabalho de me felicitar pelos três anos deste blogue. Fico com vontade de experimentar a receita de “Bombe Glacée” enviada pelo Impensável, quem sabe para um lanche em que convidaria outra Bomba que simpaticamente destacou este discreto sítio.

13.10.06

Happy Birthday (to me)

Manif

80 mil pessoas, em dia de semana e horário de trabalho, entupiram ontem o centro de Lisboa. Parece que gritaram com grande indignação contra o governo de Sócrates. Tudo certo e correcto, não fora o incómodo que causou a muita gente. Porque não se juntaram no Estádio da Luz onde até poderiam aproveitar para dar uns toques na bola?

Touros

Na sua habitual fúria proibicionista, o Parlamento Europeu votou ontem uma proposta para “por fim à luta de cães, touros e galos e adoptar normas legais nacionais ou comunitárias, segundo os casos, que assegurem que as pessoas implicadas não recebem subvenções nacionais ou estatais para organizar esses eventos”. A proposta foi aprovada após ser retirada a palavra touros. Podemos assim, por mais algum tempo, assistir, sem espírito de resistência armada, a touradas. A liberdade cultural continuará e a emigração para o México deixa de ter fortes motivos.
Na tentativa insistente de proibir as touradas, fico sempre com a mesma dúvida: o que quereriam eles fazer dos touros bravos? Se os cães e galos são animais domesticados, com existência indiscutível muito para além das suas lutas, que aliás não me interessam nada, onde iriam parar os touros? Talvez por ingenuidade, não imagino touros bravos domesticados num T1 em Telheiras ou no quintal de uma moradia em Oeiras. Nem me parece que possa alimentar a esperança de ver o Dr. António Maria Pereira a passear no Chiado acompanhado por um bonito exemplar da Ganadaria Vinhas a quem, de quando em quando, daria festinhas carinhosas. Talvez seja mais interessante pensar em ver os animais a passear à solta pelos jardins de Lisboa onde, quais pombos, viessem comer ás mãos das pessoas. Qualquer solução seria sempre muito interessante, foi aliás por isso que já sugeri a ganaderos que ofereçam alguns exemplares ás associações de defesa dos animais. Sempre gostava de ver se os tratavam melhor do que eles.

10.10.06

Versões

O som aqui do lado vai passar a ter alguma ordem, a partir de hoje serão apenas versões. Comecemos então com “Nature Boy”, uma música de Eden Ahbez, e com duas das suas múltiplas versões: Vinicius de Moraes e Toquinho, no disco “O Poeta e o Violão”, e Lisa Ekdahl, no disco “Heaven, Earth and Beyond". Para ouvir as diferenças da mesma música em duas óptimas, e tão distintas, versões.

6.10.06

Jóias

Há alguns dias, foi revelado que Portugal iria receber uma indemnização de 6,2 milhões de Euros pelo roubo das jóias destinadas a uma exposição na Holanda. Num país com o património no estado em que está, este dinheiro poderia ser importante contributo para, feito o mal de se perder um património provavelmente irrecuperável, conseguir efectuar importantes restauros. O medo vem ao olhar para a ministra que assinou o protocolo Berardo e temer que o dinheiro das jóias dos séculos XVIII e XIX se converta em prestações desse ruinoso e vergonhoso protocolo e se troquem as jóias por instalações com bidés e papel higiénico. A bem do comendador e a mal do país.

5.10.06

Comemorar o quê?

Dezasseis anos de caótica e sanguinária pseudo-democracia?
Sete anos de ditadura militar?
Quarenta e um anos de ditadura cinzenta?
Um ano de perigosos despojos revolucionários?
Trinta e um anos de democracia quase sempre mal governada?

4.10.06

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Jardim Botânico de Coimbra, 2006

Será um sinal?

Paulo Portas voltou à gravata, ontem, no “Estado da Arte”.
Irá também voltar à política activa?

Serviço Público

“Portugal de…”, conduzido por Rui Ramos, com Maria Filomena Mónica. Seguirá com outros ilustres portugueses ás terças à noite na RTP1.

Esperança

O novo Plano de Revitalização da Baixa-Chiado, coordenado por Maria José Nogueira Pinto, foi apresentado, na passada segunda-feira, pela Câmara Municipal de Lisboa.
Ao passar os olhos pelo plano fica a esperança de poder ver, finalmente, o Terreiro do Paço sem carros e com a dignidade que merece. Fica a esperança de ver gente a viver na Baixa e de que a mesma deixe de ser, à noite, um deserto de marginalidade. Fica a esperança de que a urbanidade do Chiado e a genuinidade de Alfama e do Castelo desçam as colinas e se encontrem na abandonada Baixa. Fica a esperança de que, pelo menos numa parte, Lisboa recupere dos consecutivos anos de degradação e se torne numa cidade mais civilizada.
Concebido por uma equipa credível (Manuel Salgado, Elísio Summavielle ou Raquel Henriques da Silva, entre outros), podemos ter esperança na qualidade da proposta. Haja esperança que o poder político avance, de facto, com o projecto.

2.10.06

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Quem um dia disse que o saber não ocupa lugar nunca terá tido de arrumar uma casa a olhar horrorizado para pilhas de livros e discos.

22.9.06

Impensável

Acho que um Hooper é um presente adequado para comemorar os três anos de companhia assídua do Impensável. Muitos parabéns.


Edward Hooper, “A Woman in the Sun”, 1961

Estado do Sítio

Por entre o pó atrás dos armários e as altas e desequilibradas pilhas de livros retiradas das estantes. Armários contra armários, em duelos renhidos pelo escasso espaço. O assumir da acumulação como uma doença de devastadoras consequências. A sala em versão armazém, cheia de coisas conhecidas, mas também muitas esquecidas. A tranquilidade que nos obrigamos como condição para evitar o mergulho janela abaixo. A poesia das mudanças por causa de pequenas obras em casa.

19.9.06

O mundo está perigoso

O fundamentalismo islâmico parece querer-nos cercar de todas as formas: primeiro são as bombas que nos ameaçam a vida a qualquer momento e em qualquer parte do mundo, agora é a vitimização que nos ameaça a liberdade de expressão.
Tornar o choque civilizacional em que nos encontramos numa guerra santa é de um perigo imenso, mas ceder, sem reservas, a um ambiente de constante pressão sobre os valores mais essenciais em que assenta a nossa civilização não será a melhor solução. O medo é, e sempre será, uma demonstração de fraqueza, não só física, mas também de ideais, de convicções e de valores. No momento em que mostremos medo e reverência, em que condicionemos o nosso dia-a-dia e a nossa vida a factores externos, estaremos a mostrar ao mundo que a força, o terror e as ameaças podem vencer, que nos podem vencer. Nesse momento a sociedade pela qual os nossos antepassados lutaram estará a caminho do fim e o que se seguirá é um mistério que prefiro não tentar desvendar.

Será desta?

A presença da Ministra da Educação no “Prós e Contras” de ontem serviu para que, pela primeira vez em muitos anos, passasse a ideia de que esta pasta foi entregue a alguém minimamente sensato e cujo objectivo é melhorar de facto o ensino. Não vou dizer que a Ministra é o máximo, até porque não tenho conhecimento suficiente para o fazer, mas que me pareceu que o seu discurso foi dominado pelo bom senso, isso sim. Como a sensatez é algo que escasseia neste país fiquei satisfeito, talvez seja pouco, talvez não chegue, mas seguramente é um bom caminho. Além disso, é prova da mais elementar sensatez que a Ministra esteja em colisão com os sindicatos de professores, entidades que parecem zelar mais por manter um estado contínuo de PREC do que pelos professores e pelo ensino em Portugal.

18.9.06

Desporto

O futebol em Portugal promete tratar-se de um caso de polícia. Fosse este um país (realmente) civilizado e tudo passaria das escutas desvendadas nos jornais, das claras acusações do presidente de um clube e dos golos de andebol marcados impunemente. Como estamos em Portugal, e já quase nos esquecemos do interminável caso da Casa Pia, tudo acabará em ”águas de bom bacalhau”, com o Major a ser condecorado pelo Estado com uma qualquer ordem de mérito. No campo, onde se devia jogar o futebol segundo as regras e onde alguns ingénuos jogadores persistem em correr atrás da bola, tudo deixa de fazer sentido, tão clara é a batota que envolve tudo isto.

Agradecimento

Ao André Azevedo Alves, de “O Insurgente”, pela simpática referência que fez disparar o Sitemeter.

12.9.06

Pena

A parte final que vi do “Prós e Contras” de ontem chegou. Chegou para lamentar a progressiva senilidade que infelizmente tomou conta do outrora lúcido Dr. Mário Soares. Enfim, a vida prega destas partidas e uma altura há em todos começamos a perder faculdades. Pena é que, apesar disso, se apareça na televisão de forma voluntária e se esteja, com penoso esforço, a debitar inanidades e vulgaridades ao longo de mais de duas horas.

11.9.06

Músicas

Novos sons aqui ao lado. Na Grafonola toca “Lamento no Morro”, da dupla Jobim-Vinicius, interpretado por Vinicius de Moraes, Toquinho e Maria Creuza, ao vivo em “La Fusa”. No Gira-Discos passa “La Soledad”, dos Pink Martini, com um curioso início ao som de Chopin.

Serviço Público

A série de documentários alusivos ao 11 de Setembro na RTP.

Cinco anos depois

Para lembrar, sempre, sem mas.

6.9.06

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O calor que queima faz-me querer voltar ao meu chapéu-de-sol de riscas azuis e brancas, à areia grossa e ao mar infelizmente calmo. Ás tardes divididas entre imersões marítimas, conversas paisagem, jogos de cartas ou o simples esparramar ao sol.
Com o calor não se consegue pensar, por isso a indolência é a melhor opção, aquela que apetece fazer agora, mas não aqui. Preciso das minhas noites longas com brisa vinda da serra e dos dias no meu chapéu-de-sol azul e branco.
A importância do chapéu-de-sol não é despicienda, para além de parte essencial ao processo de suportar os excessos de temperatura, é essencial na definição estética da “minha” praia, que sem as riscas de várias cores seria mais uma impessoal praia, como tantas outras. Por isso apetecia lá estar.

5.9.06

O Independente

Acabou “O Independente”. Aliás, acabou fisicamente, pois há anos que se arrastava penosamente encostado a um nome. “O Independente”, pelo menos o “meu” Indy, acabou após a saída de Miguel Esteves Cardoso de director. A segunda saída, após ser chamado para tentar inverter a decadência em que o jornal já se encontrava. Ainda assim faz pena, ou como dizia o MEC na última edição, está mal.
A minha geração cresceu com “O Independente” e irremediavelmente dividia-se entre os que o adoravam e os que o detestavam. Ninguém podia ficar indiferente a uma postura nunca antes vista em Portugal, a uma visão conservadora da sociedade que apresentava uma linguagem e um estilo mais revolucionários do que se podia imaginar em sonhos. As grandes campanhas do Bloco, muito cuidadas na imagem e linguagem, são brincadeiras de meninos ao lado do Caderno 3 dos bons tempos.
Os frutos do Indy estão aí, nos blogues e nos jornais, nas revistas e nos livros. Uma nova geração que perdeu o pudor – quer na escrita, quer nas ideias. Ser de direita deixou de ser um estigma a esconder dentro de um armário bem fechado. Escrever de forma desprendida e legível deixou de ser um crime lesa pátria.
A geração Indy mostrou-se, mas talvez pelo demasiado desprendimento e independência passa ainda ao lado da política activa, dos partidos. O anti-cinzentismo ainda não vingou e os órgãos de poder continuam iguais ao que eram em tempos de cavaquismo. Talvez seja melhor assim, talvez seja melhor poder lê-los do que ter de os ver a discursar no parlamento. Fica ainda assim uma réstia de pena, de pena que o país não tenha assimilado mais o que foi o Indy, que não seja mais Indy.

Blogosfera

Os parabéns – atrasados, é claro – por um ano de “Origem das Espécies”.
O agradecimento ao “Sempre a Produzir” pelo link para este estabelecimento.

1.9.06

Diálogos Imaginários

– Charles, estou a cozer e apetece-me ainda menos que o habitual desmanchar malas.
– Não se preocupe menino, para isso é que eu estou aqui.

Agosto


E pronto, com a tradicional ida à Havanesa no fim do mês acabou a saison.

20.8.06

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A chuva de verão cortou a rotina e fez da praia um lugar distante. Houve indignação, mas também conformismo, livros a ler e cartas a jogar, um deambular arrastado por entre montras e cafés.

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Entre o combate aos fogos que outra vez dizimam o país e o apoio à maça em anúncios com vedetas dos "Morangos com Açucar" o ministro Jaime Silva escolheu a segunda hipótese. Ele há opções que definem um homem...

12.8.06

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O fim de tarde junto ao pricípio da noite por um branco gelado e um ar mediterrânico. Estranho a falta do vento, do Norte impertinente e sempre presente. O conservadorismo abala perante a mudança, é bom, é para melhor,mas não é o mesmo, não é do mesmo.

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Calor que quebra a pele, que estala. Água de gelo, de pinguins servindo Gin-Tónico com sorrisos malandros. Calor árabe, de tendas no deserto e chá quente de menta, com beduínos vagueando por entre escassas sombras ocupadas por velhas lentas e despreocupaadas.

7.8.06

Estado do Blogue

Falta de paciência para escrever. Internet de mau funcionamento. Areia nos livros. Ipodar ao sol. Amigos revistos. Conversas de pôr a par. Calor estranho para estes sítios. Noites longas e dias longos. Praia até ao anoitecer. Está-se bem por aqui.

29.7.06

Figueira

Chega Agosto e este blog ruma ás paragens habituais. Amanhã o jornal será comprado na Casa Havanesa, onde se perguntará se há algum novo marcador de livros para este ano. Até lá fica aqui um dos antigos, com uma fotografia de tempos já passados.

Excerto da lista

Protector solar, iPod, canetas Montblanc, Moleskine.

27.7.06

Loucura

Num acto de insanidade revolucionária este blog trocou o sóbrio preto por um fundo cor de areia.

Diálogos Imaginários

– Charles, aproxima-se a mudança de verão. Pode começar a agrupar as roupas enquanto eu faço a lista de outras coisas que quero levar.
– Com certeza, menino. Tenho também uma lista do que costuma levar.
– Oh! Charles, não sei como suportaria o incómodo da mudança sem a sua ajuda.

25.7.06

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Talvez seja desculpa esfarrapada, mas o verão torna o diletantismo algo de tolerável.

Concurso

Caro Impensado,

Como é evidente, não poderia deixar de concorrer ao Primeiro Concurso de Verão do Impensável. Por isso aqui vai:
O comportamento de Dexter Haven não foi o de um verdadeiro Gentleman, pois este raramente perde as estribeiras por causa de uma mulher. A simples sugestão de uma agressão, ainda mais fora do recolhimento da casa, é simplesmente intolerável. O contacto físico com uma senhora deve ser sempre o caminho para um beijo ou algo mais, nunca para um vulgar empurrão.

Com calorosas saudações,
JAC, o Anarcoconservador

Provocação

A brigada do costume questiona a proporcionalidade do ataque de Israel após o rapto de dois soldados. Não comparando o rapto ao assassínio, recordo que a Primeira Guerra começou por causa de um “simples” e único assassinato. Terá sido proporcional?

24.7.06

Tall Ships


Lisboa esteve (ainda) mais bonita durante passagem da regata Tall Ships.

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No Médio Oriente as coisas estão más, o que é muitíssimo desagradável, para eles e para nós. Eles vão morrendo de um lado e de outro, o que afinal nem tem o picante da novidade pois há anos que se tentam exterminar persistentemente. Nós por cá, quando só queremos pensar em praia, na próxima festa, ou numa esplanada durante a noite em conversas alongadas, lá temos de fingir que nos preocupamos com o mundo sob pena de sentirmos pesos na consciência pela nossa indiferença.

20.7.06

"Época Tola"

Acabou o futebol, começou o calor, falamos de praias. Este blog entra decididamente na “época tola”, durante a qual não será de estranhar um desconhecimento profundo da seriedade e uma profusão de postas sobre inutilidades.

Crítica de Praias – Guincho

Não haja vento – uma manifesta raridade, ao nível do cromo do Hugo Viana – e esta é das melhores praias do país. A serra ao fundo, verde em anos que tenha escapado aos incêndios, o sossego da distância a qualquer povoação. Numa ponta o velho Muxaxo e o humilde barzinho de praia com bons pães com chouriço, do outro lado o mais “arreglado” “Bar do Guincho”, onde pedir algo, em dia concorrido, se pode tornar uma aventura capaz de nos fazer espancar toda uma enorme fila.
A qualidade dos acessos varia um pouco, uma vez que chegar até perto da praia é rápido, mas os carros estacionados por todo o lado entopem desmedidamente a circulação, em especial quando algum autocarro resolve tentar a sorte de passar. Pode haver alguma perda de tempo em estacionamentos, valendo mais a pena parar mais longe e fazer alguns metros a pé. No lado do “Bar do Guincho” há um impecável parque, bem delineado e arranjado, com o senão de ser, obviamente, bem pago e ter um acesso estreito que entope em dias mais concorridos.
O mar costuma ser bravio, com ondulação forte de onda longa propícia ao Surf (e com o habitual vento perfeito para o Windsurf e o Kitesurf). A temperatura da água não costuma ser encorajante, mas antes revigorante, o que, dada a ondulação e a necessidade de movimento, não se torna um obstáculo ao banho.
O ambiente do Guincho é uma das suas maiores vantagens, definiria-o como queque-descontraído-surfista, o que é dizer que quase tudo é gente nova e com ar bonito e divertido. Gente da linha, muitos surfistas e windsurfistas de caras muito queimadas desde Maio. A descontracção pulula entre pequenos biquinis coloridos e calções de banho da Osklen ou de marcas de surf. No céu, os kites rematam o colorido e na água há sempre acção por entre as ondas. Bom spot para ver bonitas meninas (vá, e meninos) de família com ar cool.
Para quem não esteja em boa forma física, uma ida ao Guincho pode ser um pouco irritante, ou mesmo deprimente. A quase inexistência de barrigas proeminentes nos homens e uma enorme densidade por metro quadrado de abdominais bem delineados, pode transformar uma ida ao banho num embaraçoso exercício de contenção da respiração de forma a disfarçar o desleixo de uma barriguita grande. Claro que se pode assumir com descontracção o físico pouco cuidado, mas fica sempre a sensação de que as meninas presentes nos olham com um ar de vago nojo. No que ás meninas diz respeito, posso dizer que a celulite não costuma passar por aqui. Talvez por um fenómeno de selecção natural “à la Darwin”, parece que toda a gordura foi queimada pelo frio da água, que enrijece as coxas e as barrigas descobertas por biquinis reduzidos. Claro que isto é excelente para os olhos que se regalam, mas pode ser motivo para traumas e viagens ao psicanalista ou ao cirugião plástico.

Classificação: Dada a importância do problema, darei a classificação em dias com e sem vento. DCV: 7 (em 10); DSV: 10 (em 10)

Agradecimentos

Aos blogues “A Causa Humana” e “Direita Conservadora” pelos links que fizeram para este estabelecimento.

18.7.06

Boas Notícias?

José Sá Fernandes vai apresentar, para votação da Câmara Municipal, um Plano Verde para a cidade de Lisboa (ver mais aqui), que consiste numa actualização de um plano já elaborado pelo Arq. Gonçalo Ribeiro Telles. Caso seja aprovado e, mais importante, cumprido, este pode ser o primeiro passo para que Lisboa sustenha o caos urbanístico que se tem tornado típico, tomando um caminho de ordenamento do território mais do que desejável.
Lisboa será por certo uma melhor cidade caso este plano seja posto em prática, o problema é que falta uma votação favorável da Câmara. Terá Carmona Rodrigues o discernimento e a coragem de levar por diante esta iniciativa e de tirar o ponto de interrogação ao título deste post?

17.7.06

Praia

Não obstante a quantidade enorme de praias em redor de Lisboa, ao coincidir a canícula agreste com o fim-de-semana, tudo se complica para quem pretenda submergir em água salgada. Contudo ainda há esperança, ainda temos praias onde conseguimos chegar sem esperar hora e meia por um lugar, em fila parada e sob o sol inclemente, no que me faz lembrar a Caparica, e aquela desgraçada vez, uma por ano, em que me convencem à deslocação e de onde regresso com veementes promessas de nunca mais. Este ano tenho cumprido, e graças a isso passei dois deliciosos dias de praia, o primeiro na “mais que civilizada” praia da Comporta e o segundo num Guincho sem vento e com a água a uma temperatura que permitia conversas longas de corpos submersos. Que maravilha de fim-de-semana!

Sonho

Passei vários dias a sonhar com Connemara e o verde fresco da Irlanda, com uma fuga ao abafo em estava. Depois veio o fim-de-semana e a praia, e o abençoar por esta costa atlântica com clima mediterrânico.

Coisa Imaginária

A ausência de postas deve-se a um curto-circuito no teclado do computador causado por fluxos de suor.

12.7.06

Diálogos Imaginários

– Charles, faça qualquer coisa que me estou a sentir dentro de um forno a ser cozinhado como um leitão.
– Com certeza, menino. Vou já fazer uma limonada absurdamente gelada.

Greve

O melhor é fazer greve ou abstinência ao trabalho, até pensar me faz calor.

10.7.06

Mundial

Foi bonita a festa, pá
Fiquei contente
E ainda guardo, sorridente
Uns belos golos para mim

Cópias

No Mundial em que (quase) todos jogaram “à italiana”, ao menos que a vitória tenha sido do original.

Mas que bem

No dia em que Zidane agride um italiano à cabeçada, a FIFA escolhe-o como melhor jogador do Mundial. E ainda falam da importância do fair-play.

7.7.06

Joga bonito

O Mundial tem gerado uma multitude de reacções, comentários, análises ou dissertações. O tema mais batido tem sido a qualidade dos jogos e do jogo das equipas. Má, muito má. Chata, monótona. As equipas pautaram-se, na generalidade, por uma clara prioridade em não perder que se sobrepõe a qualquer sonhadora ideia de querer ganhar. Os jogos afastam-se então do que entendemos por futebol para se aproximarem mais da postura do xadrez de raciocínio frio e implacável. Argumenta-se que o que interessa é ganhar, que jogar bonito é um conceito ultrapassado, fala-se de produtividade. Em abstracto é verdade, o futebol é um jogo e os jogos existem essencialmente para se ganhar. Esquece-se que este jogo, este negócio, existe e é importante porque tem adeptos, porque milhões de pessoas chamam o dinheiro da publicidade que faz mexer a máquina. O que se passa é que Mundiais como este contribuem vastamente para a diminuição exponencial dos adeptos. Como vou eu convencer os meus sobrinhos das maravilhas do futebol quando todos lá em casa adormecemos aos dez minutos de jogo?
O meu gosto de futebol foi estimulado por Sócrates e Zico, por Maradona e Valdano, por Roger Milla. Foi com este futebol bonito, para alguns inútil e pouco objectivo, que me tornei feroz consumidor de Campeonatos do Mundo, competição onde a variedade de estilos e jogos me apaixonava. Ansiava sempre pela surpresa africana, pelos novos artistas do Brasil, pelo futebol rápido e atlético da Inglaterra ou da Dinamarca. Na altura a nossa selecção era uma inexistência, só esporadicamente quebrada no Europeu em que Chalana passeou o seu futebol. A ausência da nossa selecção aguçava o gosto do jogo pelo jogo, a admiração pela qualidade e pela arte.
Hoje, só dificilmente cedo a ver jogos que não sejam da Selecção Nacional ou do Sporting. Este Mundial reforçou isto com algumas secas a que, por teimosia, me prestei. Se nada mudar, o futebol irá tornar-se nisto, um campo de batalhas nacionais (ou clubísticas) em que só a vitória interessa. Cada vez serão menos a ver jogos em que não entrem as suas equipas, cada vez serão menos os adeptos. O futebol será cada vez mais um negócio chato e desinteressante e menos um desporto estimulante.

4.7.06

Diálogos Imaginários

- Charles, apesar de ainda não saber onde vou ver o jogo amanhã, prepare-me por favor um “kit” futebol.
- Com certeza menino, vou por cervejas e vinho branco no frigorífico e comprar cajus, amendoins e uns queijos.
- Ah! Charles, é melhor ter também uns calmantes à mão, é que os jogos com França trazem-me péssimas recordações.
- Não me poderia esquecer menino, eu também padeço do mesmo mal.

Além do futebol

Não deixa de ser estranho um governo do PS endireitar-se com a saída de um ex-presidente do CDS.

2.7.06

Brasil

Tenho pena de não ter pena por o Brasil ter perdido. Manias de quem gosta de futebol e não de xadrez.

Ricardo

Tal como há dois anos, Ricardo foi gigante e uma parede de betão à frente à baliza. Ainda haverá alguém, tirando o Miguel Sousa Tavares, que se lembre de Vítor Baía?

Meias-finais

E pronto, ontem foi para sofrer outra vez. Não será possível ganhar em jogos tranquilos e previsíveis, sem que o coração salte e a adrenalina dispare ao infinito? Enfim, antes assim, pelo menos de vitória sofrida em vitória sofrida já estamos nas meias-finais.

Scolarizar

A influência de Scolari na população portuguesa pode medir-se pela Scolarização, ou seja, pelo acréscimo desmedido no optimismo e auto-confiança. A acrescentar ao nosso léxico e a usar amiúde em frases sem nada ver com futebol. Exemplos: “Amanhã o teste vai-me correr bem de certeza”, é típica de uma pessoa scolarizada; ou outra (vinda de um administrativo de uma empresa), “se continuar a trabalhar no duro acho que vou chegar a administrador”; ou ainda, “vou sacar de certeza aquela louraça de metro e oitenta”, a que apetece responder “também não scolarizes tanto”.

29.6.06

Coisas da Vida Boa

Descobrir que a falta de uso não inutilizou o meu já antigo gira-discos. Aproveito para voltar a discos há muito esquecidos, a gostos antigos. Ouço os intermináveis solos de Mark Knopfler no histórico “Alchemy” dos Dire Straits, a voz grave de Tanita Tikaram, os princípios de Rui Veloso no “Fora de Moda”. Acho que amanhã vou prolongar esta maré de nostalgia e passar aos singles do Marco ou da Abelha Maia.

Medo

Ontem à noite, ao aproximar-me com um amigo de um táxi, gracejei dizendo que íamos com um skin. Entrámos e subtilmente as mãos agarraram-se aos bancos após o senhor, até então mudo, passar quatro ou cinco sinais encarnados. Num deles ainda insultou outro condutor que apenas lhe fez sinais de luzes, estando eu já à espera que parasse o carro e saísse disparado na sua direcção. O trajecto aproximava-se do fim quando reparámos que não tínhamos dinheiro para pagar, tendo então pedido para que ele parasse num Multibanco. Fiquei no carro à espera e finalmente o homem lá abriu a boca, e é caso para dizer, para não mais a fechar. Começou pela insegurança e por situações que passou, sempre com “pretos” ou “gente do leste”. Caso a seguir a caso e já os tratava por aqueles que não deviam cá estar. O meu amigo lá chegou e o destino também. Antes que pudéssemos sair, continuou a falar. Falou da pistola que tinha no porta-luvas, do tiro que deu no outro dia a uns que o quiseram roubar, no que lhes fazia a todos se os apanhasse a jeito. Siderados, nem coragem tínhamos para sair, no medo de ofender a criatura por não o ouvir até ao fim. Uma brecha foi aproveitada para enfim sair e deixar o homem ir embora, só então respirei fundo. Esta gente é realmente perigosa, muito perigosa. São poucos, por enquanto, mas a sua simples existência dá medo. Gente desta que tem arma e cujos olhos destilam ódio, insanidade, que podem a qualquer momento matar ou ferir sem remorsos, em nome não se sabe bem de quê.

26.6.06

Futebol e Touros

O jogo de ontem assemelhou-se a uma corrida de Miuras ou Vitorinos: o interesse não foi a arte pela arte, o interesse estava na batalha “de morte” entre os oponentes, ambos desejosos de ferir. Estas ganadarias são famosas pela sua ferocidade, pelo seu perigo, por dificultarem em muito a tarefa dos toureiros. São touros imponentes e de génio, que não permitem erros, logo respondendo com investidas para colher, para ferir, para matar. As corridas com estas ganadarias estão sempre esgotadas, por público ávido de seriedade nos touros, de combates mais iguais. Poucas vezes a arte é perfeita, pois os touros não o permitem, mas o domínio do toureiro sobre o touro toma predominância sobre os alardes. São corridas de emoção a que só alguns toureiros comparecem, pois o medo muito pode.
Ontem, lembrei-me destes touros durante o jogo, que não foi uma obra de arte, mas foi emotivo, sério, duro, com muito interesse. Portugal enfrentou ontem um Miura de génio, bravo e pouco nobre, com investidas ordinárias e perigosas. Portugal sobreviveu e conseguiu uma faena plena de emoção e entrega, de coragem. Qual toureiro corajoso enfrentou de peito feito o animal, dando-lhe a lide possível depois de colhidas graves (a lesão de Ronaldo), de erros imperdoáveis (expulsão de Costinha) e da incompreensão do director de corrida (expulsão de Deco). Após a colhida foi difícil procurar a arte, pura e espectacular, mas foram cingidas as verónicas e sérios e verdadeiros os passes naturais. Houve verdade e esforço, e, a espaços, pormenores de arte pura conseguidos em momentos de maior domínio. Com o aproximar do final, touro e toureiro perderam força, e já eram mais soltos os movimentos, já as defesas estavam mais abertas, e mais perto estiveram ambos de ferir o oponente. Foi uma batalha de morte em que Portugal venceu, como vencem os toureiros – os grandes – que conseguem triunfar apesar dos touros não colaborarem.

Futebol

Ontem foi futebol duro, uma batalha épica, nem sempre bonita, bastas vezes pouco leal. Os holandeses, habitualmente cavalheiros e bem-educados, foram buscar inspiração ao seu passado de corsários e, aliando à compreensível raiva perante as consecutivas derrotas frente a Portugal, atacaram o jogo desde início com brutalidade. As primeiras faltas sobre Cristiano Ronaldo só com extrema ingenuidade não serão compreendidas como tentativas, bárbaras, de atemorizar o adversário, de preferência inutilizando-o. Não venha o Sr. Van Basten falar de fair-play, quando por certo as ordens de abate vieram da sua boca.
Com o começo holandês e um árbitro abaixo de ordinário, o jogo tinha de descambar, e descambou à séria. Tivesse havido prolongamento e talvez se acabasse a jogar futebol de sete. Não há desculpas para as reacções de Figo ou Deco, mas, perante a barbárie que já se tinha visto, seria difícil aguentar a pressão, ajudada por uma perfeita idiotia de Costinha.
O jogo foi duro, violento, e muitos dizem que feio. Não consigo concordar em absoluto com a última parte. Apesar de tudo, quantos jogos deste Mundial terão tido tantos remates e ocasiões de parte a parte? O nosso golo é uma belíssima jogada, assim como o foram alguns dos nossos contra-ataques. Os holandeses podiam ter marcado por algumas vezes e pressionaram com ferocidade. O jogo deveria ter sido mais leal e menos brutal, mas, ainda assim, houve muito futebol, jogadas de qualidade e uma emoção desmedida.

Pergunta

Aos grandes críticos de Scolari uma simples pergunta: teria Portugal ganho o jogo de ontem com outro treinador, com o conjunto dos (supostos) melhores jogadores portugueses, mas sem esta “equipa”?

20.6.06

Músicas

Mudanças nas músicas aqui do lado: na Grafonola passa agora Caetano Veloso com “Gelsomina“ do disco “Omaggio a Frederico e Giuletta”, gravado ao vivo num concerto em homenagem a Frederico Fellini e a Giulleta Masina; no Gira-Discos os imortais The Velvet Underground, com a voz de Nico, em “I’ll be your mirror” do famoso álbum da “banana”.

Delírio

Raramente abro e-mails de forwards que me são enviados, para além disso tenho “educado” os amigos para apenas me mandarem mails “realmente” divertidos e nenhum que implique cadeias que me deixam logo mal disposto e a correr para o Delete. Tudo isto a propósito do mais divertido mail que me lembro de receber e que me deixou quase literalmente a rebolar no chão a rir, fazendo tristes figuras e arfando com dificuldades respiratórias. Graças ao You Tube, aqui vai.


Para quem mais dificuldades tenha com o espanhol, pode acompanhar com a letra da música, uma autêntica pérola do non-sense.

Hagamos juntos, este crucigrama
Aplacemos lo otro, para mañana
Cantar contigo, me llena de alegría
Chalalala chalalala...
Dejemos todo lo demás, para otro día
Quisiera besarte, pero sin ensuciarte
Quisiera abrazarte, sin dejar de respetarte

Amar es saber esperar, es saber esperar, es saber esperar
Amo a Laura,
Quiero esperar hasta el matrimonio
Amo a Laura,
Quiero esperar hasta el matrimonio
No voy arrancar esta flor,
Que la destruya, no será yo

(Falado) Joven, recuerda que el amor nace del respeto, que no hay nada más hermoso en una pareja, que saber esperar juntos ese momento maravilloso, que es la consumación del amor, tu paciencia tendrá recompensa!

Amo a Laura,
Quiero esperar hasta el matrimonio
Amo a Laura,
Quiero esperar hasta el matrimonio
No voy arrancar esta flor,
Que la destruya, no será yo

Para completar o delírio aconselho vivamente uma visitinha ao site da “associação” responsável por este vídeo: Asociación Nuevo Renascer. Quem sabe surgirão mais candidatos a Presidente do Clube de Fans dos Happiness, o grupo que interpreta esta grande música.

19.6.06

Bizarrias

Foi muito estranho chegar ao meio de um jogo do Brasil a desejar que eles percam. Sim, ontem antes do intervalo já dava por mim a torcer pela Austrália, país pelo qual não tenho nenhuma especial simpatia, afinidade ou proximidade. A apresentação miserável de um conjunto de jogadores geniais levou-me a querer que perdessem, e mereciam. Para quem gosta de futebol, o Brasil de ontem – e, já agora, do jogo com a Croácia – não merece ser o mesmo país da selecção de Sócrates, Zico e Falcão. Chamem-me sonhador, mas o Brasil não pode ser nunca uma selecção calculista e sem alma, aliás, poder até pode, não pode é chamar-se Brasil. Parreira parece um eficiente cozinheiro que, perante as melhores matérias-primas, cozinha rapidamente um almoço inteiro, mas em que tudo está desenxabido e sem sabor. Desperdícios…

Telegrama do Mundial

Bom jogo. Bom resultado. Esperemos pela Holanda.

Agradecimentos

Ao Arte da Fuga, ao Em Nome Próprio, ao Boca de Incêndio e ao Conversa Livre pelos links simpáticos para este estabelecimento.

A banhos

Os feriados foram aproveitados para ir a banhos. O tempo desconvidava a esta opção, mas alguma teimosia nostálgica lá me levou até terras figueirenses, insistindo que o caminho fosse em direcção à praia. Nuvens muitas, a rodos, mas uma temperatura agradável para ler, ao som do meu iPod que me fazia esquecer a falta do sol e dos mergulhos no mar. O último dia lá chegou com sol, com o calor necessário à imersão em águas salgadas. Até lá, alguns passeios e a essencial visita à vetusta e venerada Casa Havanesa para compra de jornais e livros. As poucas coisas da terra que resistiram à voragem da destruição lá se vão mantendo, e os enublados passeios traziam “quelque chose” das decadentes praias da Bretanha em primaveras húmidas.

13.6.06

Coisas da Vida Boa

Os “Santos” ontem, em versão fidalga. Os aperitivos ao pôr-do-sol de “flûte de champagne” na mão, apreciando do quarto andar a organização das mesas e o carvão a aquecer para mais tarde receber as sardinhas. O povo ia chegando e num pequeno palco o inevitável órgão, tocado por músico esforçado, abrilhantava a festa com pérolas da música pimba portuguesa. A comida subiu de cesta e corda, directamente saída da grelha, e foi sendo acolhida lá em cima pelos divertidos convivas. A noite prolongou-se com sangria de vinho branco e danças animadas. Um pouco fascista, assumo, pouco popular, é verdade, no entanto muito agradável.

12.6.06

Telegrama de ontem

Jogo Medíocre. Bom resultado. Grande Figo.

Diálogos imaginários

– Charles, afinal sempre vou passar uns dias à praia. Faça-me por favor as malas, mas não esqueça que parece que pode vir a chover.
– Com certeza menino, esteja descansado que não me esquecerei de alguns abrigos para o vento e a chuva e tudo estará pronto daqui a pouco.
– Não tenha tanta pressa Charles, só vou amanhã e hoje ainda vou dar um saltinho aos Santos.
– Faz bem menino, aproveite para se divertir um pouco.

8.6.06

E não se pode bater-lhes

A Ministra da Educação anunciou ontem uma proposta para que as escolas do ensino básico tenham, obrigatoriamente, actividades extracurriculares, nomeadamente de Inglês, Educação Física e Ensino Artístico (em particular Música). A medida pode ser questionável por muitos motivos – se há dinheiro, se as escolas têm as condições físicas necessárias ou se há professores suficientes para acompanhar as actividades –, agora, pasme-se, qual foi o grande entrave posto pela inefável FENPROF: segundo este sindicato, a proposta é inaceitável porque esvazia os conteúdos de disciplinas já leccionadas em horário escolar! Quer dizer, o facto de uma escola passar a ter um coro, por exemplo, esvazia os conteúdos de Educação Musical onde se aprendem os rudimentos do solfejo; o facto de os alunos poderem ter horas de conversação informal em inglês, por exemplo, esvazia de conteúdos a disciplina onde os mesmos aprendem a gramática da língua de maneira mais formal; o facto de os alunos poderem ter campeonatos inter-turmas dos mais variados desportos, por exemplo, esvazia de conteúdos a disciplina de Educação Física! Enfim, é esta gente que representa os professores e consegue ter uma força inaudita na sociedade portuguesa, mercê da chantagem constante da greve, tendo sido a próxima “jornada de luta” (dia 14 de Junho) convenientemente marcada, como sempre, entre o feriado municipal de Lisboa (13 de Junho) e o feriado do Corpo de Cristo (15 de Junho). Com tudo isto ainda tentam ser levados a sério por gente séria. E que tal recuar aos métodos de há um ou dois séculos e corrê-los todos à bastonada?

6.6.06

Requiem por um bom jantar

Chegamos tranquilamente e perguntamos pela mesa. Dizem-nos que demora um quarto de hora, pelo que abancamos no bar. Pedimos um Gin-tónico e acendemos um cigarro – correcção, segundo a nova proposta de lei não acendemos nada, ou então, saímos de copo na mão para a porta e fumamos um cigarrito ao ar livre, mesmo que estejam zero graus. A mesa lá está pronta e vamo-nos sentar. A demora habitual na escolha dos pratos e, depois de continuar no Gin ou optar por um vinho branco, lá puxamos de um cigarro enquanto as senhoras decidem que prato vão comer – correcção, segundo a nova proposta de lei não puxamos nada, e como seria indelicado levantarmo-nos agora, roemos um pouco os dedos e começamos a ficar com um humor menos apresentável. Já estamos pouco divertidos quando chegam as entradas com as quais nos entretemos, findas as quais fumamos um cigarro – correcção, segundo a nova proposta de lei não fumamos nada, ou então simulamos uma ida à casa de banho e fugimos até à porta onde, mesmo que estejam quarenta graus e o restaurante não tenha toldo, fumamos desesperados um cigarro que até se calhar não fumaríamos à mesa, mas que a proibição nos dá umas ganas de fumar. Lá dentro a comida ameaça chegar, e aqueles que não saíram para a casa de banho apresentam uma face que deixa adivinhar um rosnar ao primeiro factor externo que complique o periclitante equilíbrio interior em que se encontram. O jantar até foi bom e tudo estava óptimo, e o simpático chefe de sala lá aparece a perguntar por sobremesas. Umas senhoras ponderam uma fruta perante os olhares desesperados e a deitar fumo de quem dava a vida por um cigarro. Mais de metade da mesa começa a puxar por um cigarro, o mais desejado que vem a seguir a qualquer boa refeição – correcção, segundo a nova proposta de lei não puxa por cigarro nenhum. As regras de boa educação são então, e em definitivo, quebradas, e a mesa levanta-se toda – para desespero do chefe de mesa que pensa que querem fugir sem pagar – e forma-se um aglomerado à porta com convivas de mais mesas entre cotoveladas e empurrões devido à chuva que vai caindo sem que haja abrigos para a mesma nas imediações do restaurante. A confusão instala-se perante a recusa dos clientes em tomar o café à mesa, pelo que a chegada de bandejas de café até à porta – entretanto oferecidas pela gerência para acalmar um pouco os ânimos – é saudada com aplausos, que fazem acorrer ás janelas senhoras com rolos no cabelos e roupões turcos cor-de-rosa e homens peludos em tronco nu que olham incrédulos toda a cena.
Imaginam-me num filme destes? Uma vez de três em três meses ainda vá – o sacrifício faz parte da vida –, agora jantar fora deixará, com enorme pena minha, de ser um programa aceitável. Ganharão os take-away, porque por enquanto – embora tema que não por muito tempo – as leis fascistas ainda não entraram para dentro da nossa casa e aí, aí poderemos jantar tranquilamente.

3.6.06

Veto

Aplausos sinceros e vivos ao primeiro veto do Presidente da República, impedindo a aprovação da lei da paridade em nome da liberdade e contra a descriminação positiva. Que a lucidez venha de algum lado!

O Campo e a Cidade

Hoje, Lisboa foi “invadida” pelo “Mundo Rural”, que animou a Capital lembrando que o leite não jorra de fábricas e a carne não é criada em congeladores. O Ministro da Agricultura anunciou, que coincidência, umas vagas medidas de apoio aos agricultores, acenando com muitos milhões. Parece que agora passaram a trabalhar ao Sábado, o que não deixa de ser uma novidade a realçar. Para bom entendedor, fica patente a hipocrisia de um ministro cuja remoção do governo seria uma atitude ao abrigo das leis da verdade e honestidade intelectual.

Agradecimentos

Ao André Azevedo Alves, de "O Insurgente", pela simpática referência ao post anterior.
Ao "Devaneios de Caim", ao "Publicista" e ao "Textos para Tudo" pelos links para este estabelecimento.

1.6.06

Luminária

Segundo as notícias do dia, José Saramago, que faz parte da Comissão de Honra do Plano Nacional de Leitura, disse desconhecer os conteúdos desta iniciativa e que a mesma não tinha grande utilidade. Para Saramago a leitura é uma actividade de minorias e sempre assim será, sendo que iniciativas que a tentem promover são sempre inúteis. Assim vai o comunismo das igualdades, iguais sim, mas só alguns.

31.5.06

Private joke

“Mas, de repente, o Albuquerquezinho arremessou a torrada que tomara do prato e empertigado na cadeira, fazendo estalar os nós dos dedos, olhou sucessivamente as duas velhas com rancor. Exigia as torradas quentes, louras, a escorrer de manteiga e encontrando uma seca, rosnou com azedume:
– Se sabem que me faz mal! Se sabem que me faz muito mal! E não é uma, são todas que estão secas. Já é desleixo.”
Eça de Queiroz in “A Capital”

29.5.06

Crises

O país está em crise, mas oitenta mil pessoas – sim, não é gralha – encheram, este Sábado, o Rock in Rio. Compreendo a ansiedade do país em escutar que “porque a mim tanto me faz, que digas coisas boas ou coisas más”, na voz dos indescritíveis – por falta de paciência – D’ZRT (deve, aparentemente, ler-se Deezêrt). Ou, com o calor que estava, gritar que “algo levantou poeira” na voz da frenética – até nos cansar – Ivette Sangalo. O único motivo de real interesse, a barriga bamboleante de Shakira, perdia-se na distância ao palco que impedia um convite para cear ao abrigo da multidão. Mas supostamente há crise e um bilhete para esta coisa custava 50 Euros. Assim como assim, e assumindo o gasto, antes uns jaquinzinhos e umas pataniscas de camarão, seguidas de umas costeletas de borrego panadas com arroz de grelos, terminando com um mousse de chocolate ou um leite-creme. No Papaçorda, é claro. Com os cinquenta euritos até deve dar para não ter de escolher o tinto mais barato da lista e beber um whiskey com o café. Enfim, cada um com as suas opções, mas eu, crise por crise, antes poupar para o Papaçorda.

Diálogos Imaginários

– Charles, por favor mude os lençóis todos os dias enquanto esta canícula se mantiver, a única maneira de a suportar é mesmo dormir em lençóis de linho frescos. E não se esqueça de reforçar o stock de chá gelado, é que com este calor desaparece num instante.
– Não se preocupe menino, já tratei das duas coisas e comprei muitos vegetais e fruta para amanhã.

26.5.06

Acrescento

(ao post “Carrilho e Dan Brown”)
Num momento de chafurdice mental, e noite de insónia, acabei por assistir, via RTPN, ao famoso Prós e Contras com o Professor Carrilho. Ao post já escrito nada a retirar, apenas um ligeiro pormenor a acrescentar: a bem da saúde pública, o senhor deveria ser “convidado” a passar uma temporada num hospital para doentes mentais. A insanidade do Professor chegou a mostrar teores de demência que só o foro psiquiátrico poderá explicar. Afinal, mais do que mimado e profundamente mal-educado, o senhor é portador de uma qualquer doença mental que o aliena e afasta da realidade. A sociedade deveria tomar medidas pois, após acusar meio mundo de uma conspiração, reescrever entrevistas que deu ou insultar adversários de forma nojenta, a agressividade pode tomar conta do seu corpo e passar a agressões físicas no meio da rua. Não sei porquê, mas a sua cara estampada na capa do livro, com um sorriso vagamente alucinado, faz prever que esteja vestido apenas com uma gabardine e tenha sido fotografado após regressar a casa do Jardim da Estrela. A sociedade que se cuide.

23.5.06

Grafonola e Gira-discos

Mudanças nas músicas aqui ao lado com uma escolha um pouco anacrónica: na Grafonola passa “Sonatine Bureaucratique” de Erik Satie, tocada por Aldo Ciccolini; no Gira-Discos temos “The Guns of Brixton” no punk-ska inesquecível dos Clash.

Carrilho e Dan Brown

Triste país em que um mal-educado político humilhado volta a ser falado por todo o lado ao ter lançado um livro onde elabora uma pretensamente sofisticada teoria da conspiração. Não li, assim como tenho evitado, por higiene mental, outros comentários ou debates televisivos sobre o assunto. Um senhor americano conseguiu num livro, que também não li por manifesto preconceito intelectual, elaborar uma conspiração acerca de um código que se tornou um enorme sucesso agora transformado em filme. Carrilho estará a treinar para ser o Dan Brown português?

20.5.06

Campo Pequeno IV – Crónica taurina

Praça cheia, como dá gosto ver, com um público a revelar ao longo da corrida uma exigência pouco vista e que muita falta faz à festa dos toiros.
O curro da ganadaria Vinhas cumpriu assim-assim: não brilhou por falta de casta e bravura dos touros, não tendo no entanto estragado a noite aos toureiros. O quarto e sexto eram mais tardos e reservados, não tendo, apesar disso, sido aproveitados da melhor maneira pelos toureiros.
Abriu a corrida João Moura com um touro suave, que foi bem entendido e toureado. Nos compridos o problema costumeiro de Moura: esquecendo não estar em Espanha, insiste em recusar a sorte frontal que estes ferros exigem. Correcto na colocação. Para os curtos Moura teve, apesar da falta de sal, touro para lidar à sua maneira. Brega vistosa, com o touro colado à garupa do cavalo e ferros que conquistaram o público que não recusou ovações sonoras. O touro foi pegado por Diogo Sepúlveda, dos Forcados Amadores de Santarém, que bem citou e pegou o touro.
Recebeu o segundo da noite com um ferro à sorte de gaiola António Ribeiro Telles, mostrando cedo a disposição para triunfar. Lide impecável – aproveitando um touro doce, mas com investida – começada com compridos de praça a praça como mandam os cânones do toureio. Nos curtos esteve excelente, numa lide cheia de pormenores toureiros e ferros bem preparados. Belíssima lide que entusiasmou sobremaneira o público. O touro foi pegado por José Maria Cortes, dos Forcados Amadores de Montemor, que não entendeu a investida do touro, tentando pegá-lo sem recuar o que redundou e duas tentativas falhadas.
Rui Fernandes toureou o terceiro da corrida, granjeando alguns aplausos com o seu toureio irreverente, mas bastas vezes excessivo. Lidou com suavidade e conseguiu ferros de boa nota. A pega foi efectuada pelo Cabo dos Forcados Amadores de Lisboa, José Luís Gomes, que deu uma lição pedagógica sobre a arte de pegar touros. Belíssimo cite, excelente a recuar, magnífico na reunião. A pega da noite efectuada por um veterano das arenas.
O quarto touro saiu para João Moura que não conseguiu encontrar a lide correcta para um exemplar de fraca qualidade. Esteve mal nos curtos e escutou assobios – algo tão raro como necessário em praças portuguesas – apesar de encerrar com um digno ferro de palmo. Como senhor toureiro que é recusou a volta à praça. A pega de António Jesus Grave, dos Forcados Amadores de Santarém, foi vistosa e correcta.
Saiu, embalado pelo triunfo no seu primeiro touro, para o quinto da noite António Ribeiro Telles. Recebeu o touro à saída dos curros, aguentando a sua investida até o colocar para um belíssimo primeiro comprido. Os compridos foram de praça a praça, e só o falhanço na cravagem de um deles foi nota menos boa na sua actuação. Nos curtos esteve mais uma vez em grande plano, com ferros frontais e emotivos e brega magnífica. Rematou uma noite de enorme triunfo com um ferro de palmo brindado à família. A pega foi feita por Pedro Freixo, dos Forcados Amadores de Montemor, que esteve muito bem com o touro.
O último da noite foi lidado, e mal, por Rui Fernandes. Não querendo exagerar, veio neste toiro ao de cima o pior defeito deste toureiro: querer impor aos touros os “números” que cada um dos seus cavalos faz (câmbios, ladear, patas que levatam,…) e todos o fazem. Esteve mal com o touro, cravando compridos em câmbio! Nos curtos quis, com o primeiro cavalo, cravar a câmbio e voltou com outro cavalo que fazia o número de levantar uma das patas dianteiras. Alguma confusão entre toureio e circo, perante um touro manso e parado, que também não ajudou. Pegou Gonçalo Maria Gomes, dos Forcados Amadores de Lisboa, a fechar com chave de ouro esta noite com uma bonita pega.
A corrida terminou com a banda, que esteve excelente ao longo da corrida, a tocar o hino, que foi cantado em pé e com enorme dignidade por todo o público presente num epílogo bonito para uma noite a recordar.

Campo Pequeno III – Manifestação

À porta da Praça acolhia-nos uma manifestação de uns grupos de defensores dos animais, também eles com saudades de terem motivos para sair ás ruas com seus cartazes. Muito gritavam e insultavam quem passava, procurando – “comme d’habitude” – que alguém perdesse a paciência ao ser apelidado de assassino e lhes desse uns bons pares de estalos. Claro que a seguir se iriam queixar à imprensa dizendo o quão brutas são as gentes dos toiros. Filme já visto.
Pelo meio destrinçavam-se t-shirts do Che Guevara, levando a que nos apeteça tirar a seguinte conclusão: Nós que gostamos de touradas somos bárbaros e assassinos, enquanto eles, que admiram o guerrilheiro da barba que, só por acaso, até matou razoável quantidade de gente, são uns benfeitores da humanidade contra a nossa selvajaria. Enfim, paradoxos do nosso mundo.

Campo Pequeno II – A Praça

Catita. O rejuvenescido Campo Pequeno está catita a valer. Belíssima obra de recuperação, num exemplo infelizmente raro neste país. Parece que foram muitos milhões, mas a avaliar pelos resultados foram bem empregues. Não se pode dizer que valeu a espera, porque foram muitos anos, mas lá que ficou bem, isso ficou. Majestosa será a melhor definição para esta “nova” Praça de Touros do Campo Pequeno.

18.5.06

Campo Pequeno

Ao fim de muitos anos de espera, lá reabriu anteontem o Campo Pequeno. Parece que é obra boa. Hoje lá o irei comprovar na inauguração pública com aquilo que era, e deve continuar a ser, a principal função do espaço: uma corrida de touros. Eram muitas as saudades das nocturnas de quinta-feira, dos touros à séria na praça de referência do país. Lisboa não foi a mesma neste interregno de tantos anos e a prova da falta que fez é que os bilhetes voaram na segunda-feira e não fora a abençoada Internet e a coisa teria sido difícil. Sector seis e lá estarei.

17.5.06

Inquilinos e Senhorios

O governo acordou de repente a pensar que devia ser de esquerda, vai então apresenta uma Lei para o Arrendamento que, a uma primeira breve leitura, é digna de uma Nova Albânia. Durante anos a fio vem se arrastando uma situação que é da inteira responsabilidade do Estado Português – do governo que aprovou o congelamento das rendas e de todos os posteriores governos nada fizeram para as descongelar. Perante isto o que faz este governo: lava as mãos e divide as responsabilidades entre inquilinos e senhorios. O Estado assobia e, sem lhe chamar assim, propõe uma expropriação das casas na forma da compra pelo inquilino do imóvel a um preço em função do valor fiscal do mesmo. O desgraçado do proprietário, que vem há anos a ser a Segurança Social dos inquilinos – necessitados ou não –, arrisca-se então a ficar sem casa. John Cleese regozijaria com este tema para um sketch dos Monthy Python.

Arte

Scolari, com quem por motivos estranhos até simpatizo, decidiu quem vai ao Mundial da Alemanha. A convocatória é polémica, como o seria em qualquer país civilizado em que o melhor jogador do campeonato não fosse convocado. Quaresma fará obviamente falta, não a titular, mas como substituto de luxo para virar resultados desfavoráveis ou dar golpes de misericórdia em resultados favoráveis. Perdemos, para o Mundial, a arte de um dos jogadores que me faz, apesar de tudo, gostar de futebol.

15.5.06

Estado do Sítio

Este blog, tal como o país, anda numa modorra que torna desnecessários comprimidos para dormir e eleva as necessidades de cafeína, o calor chegou e começa fazer as mentes dormentes.

Boas notícias

Paulo Bento renovou e não conta com Sá Pinto, talvez assim para o ano terminemos mais jogos com onze jogadores e sem penalties idiotas contra nós.

8.5.06

Diálogos Imaginários

– Charles, ainda bem que voltou, já tinha saudades suas.
– O menino como tem passado? Peço desculpa pela ausência, espero que tenha sobrevivido sem mim.
– Com dificuldade, Charles, com dificuldade.

5.5.06

Música

Mudanças nas músicas aqui ao lado. Na Grafonola pode-se ouvir “Pernambucobucolismo”, do álbum “Infinito Particular”, o último da sempre excelente Marisa Monte. No Gira-Discos a voz imortal de Camarón de La Isla, o grande “cantador” de flamenco, aqui com uma letra de Frederico Garcia Lorca: “Mi niña se fue a la mar”.

4.5.06

América

A cada dia me surpreendo mais com o fundamentalismo anti-americano, logo eu que não gosto em especial da sociedade americana, não gosto particularmente de Bush, acho que a Guerra do Iraque foi um disparate criminoso, gosto de muitos produtos oriundos da América (cinema, música, literatura) mas não ia viver para os Estados Unidos, resumindo, tenho, por pouco tempo porém, uma saudável relação crítica para com a América,
Os argumentos que ouvi há dois dias, oriundos de alguém intelectualmente mais do que estimável e politicamente independente, contribuíram para a convicção de que ainda me tornarei um feroz americanista, capaz de rivalizar com a cegueira de um Vasco Rato. Discutia-se política à escala mundial, as privatizações do “sensato” Chavéz, a “ponderação” do “discreto” Morales, o imperialismo americano. A discussão animou e falou-se da primordial importância dos americanos no fim da segunda guerra mundial e do quanto lhes devemos. Aqui tudo se baralhou, e a cegueira anti-americana culminou num argumento precioso: “A guerra iria acabar de qualquer maneira, uma vez que demograficamente os alemães não a poderiam suster, e não podemos provar que foi a intervenção americana que, de facto, parou a guerra.” Perante a estupefacção e indignação generalizada esbocei que até é verdade, como é verdade que nada prova que o 25 de Abril foi essencial para acabar com a ditadura – ela poderia acabar por si –, ou que os Conjurados apenas anteciparam o abandono do nosso país pelos espanhóis. O argumento vale o que vale, não é que seja necessariamente mentira, apenas invalidaria toda e qualquer a análise histórica. No entanto, a melhor conclusão que ainda consegui espremer foi a seguinte: se a guerra acabaria de qualquer maneira, mesmo sem a intervenção americana, era só uma questão de tempo, ora como no entretanto ia morrendo gente, muito em particular judeus, talvez a limpeza étnica se aproximasse dos seus objectivos. Assim, com um pouco de “sorte”, poucos judeus sobrariam e não seriam suficientes para a criação de Israel, o que seria óptimo para o mundo de hoje já que acabaria com o problema do Médio Oriente e, talvez até, com o novo terrorismo. Concluindo, a culpa da instabilidade no médio oriente é dos E.U.A., mas não só de Bush, a culpa vem Roosevelt e Truman que permitiram a sobrevivência de demasiados judeus. Enfim, o imperialismo já tem demasiados anos para que não nos rebelemos contra ele.
Perante tamanho disparate, ainda me vão ver, um dia destes, em manifestações pró-Bush, não é que eu queira, mas a alucinação perigosa do outro lado ainda me vai obrigar a isso.

29.4.06

Notas de Viagem – Sevilha II

Seis e meia em ponto, Real Maestranza cheia, como sempre em corridas de feira. Hasta la bandera como diriam os locais. Silêncios sepulcrais e emoções incontidas. Os toiros saindo à praça bravos, investindo em burladeros e capotes. Os toureiros provando investidas em vistosos passes de capote, os picadores recebendo as fortes investidas sustidas por decididas varas que ferem o animal e mostram a sua bravura com a insistência com que continuam a investir ao mesmo tempo que são agredidos. O brinde ao público no centro da praça ao som de um coro de aplausos esperançosos de uma lide valente e inspirada. Silêncio e os primeiros passes por baixo, baixando a cabeça ao toiro, comprovando a sua bravura e nobreza. Os primeiros olés, espontâneos, que brindam quites arrimados e passes templados. A lide em crescendo com o público a corresponder com aplausos e olés. A faena que foi redonda, emotiva e bonita – o matador suplantou com inteligência e arte a força bruta e brava do animal. O momento fundamental chega, o epílogo deste jogo de vida, no silêncio ouvir-se-ia um alfinete a cair, o toureiro perfila-se, espada na mão direita, e entra, com todas as ganas necessárias, a matar. Estocada inteira, completa, provavelmente mortal. O toiro contorce-se e fica abalado, mas continua a investir, com bravura, com uma bravura rara e digna. A morte tarda, por forças que chegam do interior da sua ancestralidade, e o toiro arrasta o seu corpo quase inanimado até ao centro da praça, até onde apenas os bravos vão morrer, fora dos seus terrenos das tábuas, onde a protecção não chega. No centro, sob os aplausos emocionados do público, cai, com uma dignidade própria dos grandes.