30.8.05
Normalidade
As festas de Barrancos estão a decorrer na normalidade e nem os habituais “amigos” dos animais apareceram. Haja alguma coisa que se mantenha normal neste país para que haja alguma (tenuíssima) esperança.
29.8.05
Diálogos Imaginários
– Charles, já sabe o que o espera. Não tenho pressa, mas quando puder desmanche as malas, deixe a roupa em dia, reabasteça a despensa, enfim, ponha a casa em ordem.
– Com certeza menino, eu sei o quanto detesta lidar com chegadas e partidas.
17.8.05
Estado do país
O país continua a arder e o primeiro-ministro continua no Quénia. Enfim, tudo normal neste Portugal entregue - desde há demasiados anos - à bicharada.
Crónicas da Figueira VI
A tranquilidade quase bucólica deste lugar vem sendo barbaramente quebrada. As modernices. As inenarráveis modernices. Há sempre queixas acerca da imutabilidade, mas também o "novo" não tem de irromper como um vulcão.
Por aqui, após anos de lenta - porém agradável - decadência, a modernidade foi aparecendo com a subtileza de um elefante. Aulas de aéróbica na praia, junto à marginal, com música adequada em volume tão discreto que nos hotéis limítrofes se tem de adequar os horários próprios ás horas das mesmas. Concertos em palcos que entopem esquinas nas ruas e obrigam a sorver os cafés nas esplanadas com rapidez para fugir a tempo de evitar a surdez. O "Mundialito" de Futebol de Praia - que nos últimos anos trouxe o inferno a esta praia - rumou, por graças divinas, até ao Algarve, onde espero continue a massacrar inclementemente os veraneantes. No meio de tudo isto, os músicos de rua tornam-se agradáveis presenças pois apenas trazem consigo um pequeno amplificador que acaba a soar a suave flauta perante o resto.
Enfim, tudo estava já mau até surgir o horror, o inferno que até a Dante surpreenderia e que chegou com o último fim de semana. O palco montou-se junto ao Forte de Santa Catarina que - coitado - habituado a bárbaras tempestades de outros tempos, nunca imaginou o que o esperava. Do Brasil lembramos Vinicius, praia, João ou Caetano e preferimos esquecer os forrós, os pseudo-sambas, os sons comerciais que ouvimos em feiras e discotecas de província. Tentem imaginar o drama de um palco a debitar - em contínuo, dia e noite - samba (mau) e forró, com uma intensidade sonora que fez temer pelas paredes de pedra do Forte e que terá, possivelmente, de levar a uma intervenção do IPPAR sobre as mesmas. Mais ainda, complementado - não fosse alguém esquecer o "espectáculo" - por camiões cobertos por colunas e gente a dançar que quase me causaram uma indigestão de uma sapateira que tentava comer numa esplanada.
A visão é de um inferno, de que alguém terá alucinado e prostituído uma cidade em nome de alguns cobres. Na praia, só dentro de água, de preferência em mergulhos longos, conseguíamos por vagos momentos escapar ao ruído.
Nos dias de hoje há quem imagine que o som, a música, são bons por si só. Cada vez mais penso que o silêncio vale a pena e aprecio-o agora, quando o sol se põe e olho para o fim de semana que passou. Algumas crianças brincam civilizadamente e o sol vai caíndo. A paz voltou a esta terra que agora será terreno mais calmo, talvez mais deprimente pela saída de algumas pessoas, mas calmo.
Crónicas da Figueira V
O agradável de surpreender uma longa noite - no interior de uma enorme voragem alcoólica - com uma longa conversa sobre Hitchcock. Poucas conclusões, mas a unânime - porém polémica - decisão de que "Psico" será a obra menor do Mestre.
11.8.05
Crónicas da Figueira IV
Nuvens, chuva. Uma benção dos céus para acalmar as chamas do país. Por aqui, tempo para umas canastas e lanchinhos. As noites alongam-se mais sob a perspectiva da praia ser uma miragem distante no dia seguinte
6.8.05
Requiem por um país
Todos os anos o mesmo, o de sempre. A tragédia costumeira. Tudo se repete, as causas, as desculpas, as queixas. Mas tudo sempre se repete. O país arde e os incompetentes que nos governam, que nos andam a governar há anos, continuam a demostrar a sua incapacidade e irresponsabilidade, a sua postura criminosa. Porque criminosos não serão apenas os que ateiam os fogos, são também os que permitiram que este país se transformasse numa República de Bananas em que o território se desordenou até ao caos e em que é prioritário fazer obras de fachada como a Ota em vez de se gastar dinheiro em algo muito mais importante: salvar o país.
4.8.05
Crónicas da Figueira III
Chegadas, beijos do mês. As primeiras conversas em tom de ponto da situação. Os que estão, os que virão e os que já não vão estar. Na praia o costume, discussões acesas com os banheiros. Todos os anos começa assim. Porque há menos espaço, porque já temos cadeiras de plástico. As banheiras, de bloco atrapalhado em punho, tentam dizer onde são os lugares de cada um. Nunca é pacífico, porque o lugar não é o mesmo, porque não se quer aquela família com seis crianças ao lado, porque aqueles dois não se falam. A banheira - refém das suas confusões e trapalhadas - atarantada com tanta gente, gesticula que tem de ser assim, que não se pode alterar, que - pronto - se pode chegar um pouco para o lado este chapéu. Sempre assim, todos os anos. Por aqui, o grande drama e tema de conversa dos primeiros dias - a par de divórcios e ausências - é a problemática dos chapéus de sol na praia.
2.8.05
Crónicas da Figueira II
Os posts vão ser ainda mais anárquicos agora, as férias e a necessidade de atravessar a rua para vir ao cibercafé vão tornar a tarefa penosa e cansativa. Enfim, veremos como vai correr. A manter-se a nortada impertinente que tem varrido a praia talvez faça deste cantinho o meu refúgio.
Crónicas da Figueira I
Ontem, viagem via Norte. Este blog deslocalizou-se com as minhas férias e a Figueira da Foz passa a ser a sua sede. No caminho - e em conversa com a minha mãe - recordo esta mesma viagem há uns anos atrás, a família toda, a confusão. O dia era planeado com antecedência e a sua chegada aguardada com nervosismo. As bagagens eram empilhadas em camioneta alugada por entre tomates e batatas. A mudança de casa no sentido literal. A chegada frenética e casa cheia para a qual só faltava levar galinhas. Hoje tudo é mais simples, basta um carro atulhado com malas por certo inutilmente cheias. Mesmo racionalizando e evitando despejar o armário inteiro para dentro das malas - algo feito amiúde em outros anos -, há sempre o hábito herdado da camioneta de tentar mudar de casa, de levar coisas que até podem fazer falta, mesmo que todos os anos digamos que é a última vez.
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