O presidente da Câmara de Lisboa, apesar da figura cinzenta que ostenta, trazia consigo uma certa imagem de competência. Não obstante ser amigo de Santana, as suas passagens por Câmara e Governo deixaram um rasto do mínimo de sensatez. Mero engano!
Foi anunciada a transferência da Feira Popular para o Jardim do Tabaco. Pobre Jardim do Tabaco, já o ameaçaram com um Casino, já deitaram armazéns abaixo, e agora querem lá pôr o antro do barulho e do néon.
Eu sei muito bem onde é que mandava o Presidente meter a Feira Popular, era até no mesmo sítio onde o mandava meter o túnel do Marquês, claro que se completaria isto com um açoitamento na praça pública e imediato exílio compulsivo.
Primeiro foi Monsanto, essa réstia verde sobre a qual pairam ameaças constantes e para onde os gulosos olhares de Santana e desta criatura não param de se virar. Até lá porem qualquer coisa não vão descansar, se não for a feira vai ser o Jockey, se não for o Jockey hão-de arranjar uma Torre do Siza, se não for a Torre…se calhar ainda propõem uma gigantesca estátua do Timoneiro Santana, erguida pela cidade em agradecimento à iluminada criatura.
Voltando ao Jardim – que para o tabaco haverá outra posta – é melhor o presidente não me aparecer à frente. Outrora um pacifista, dia a dia a minha furiosa esquizofrenia leva-me a instintos agressivos – conquanto ainda não homicidas. Pois bem, a Feira Popular mesmo junto ao rio, os belíssimos néons reflectidos na água, as magníficas músicas dos carrosséis, uma noite feérica em versão de qualidade – segundo a criatura, queira isso dizer o que queira. Será que ele não conhece Alfama, será que o animal nunca foi ao Miradouro de Santa Luzia, ou a Santo Estêvão, será que animal não percebe que Alfama é, na sua genuinidade, a Lisboa mais pura que temos e que as suas vistas sobre o rio são dos melhores cartões de visita que a cidade pode apresentar. Será que o animal não vê que quase todos os turistas passam e adoram Alfama, será que o animal ainda não percebeu o que vai ser a vista de S. Vicente de Fora com “Rodas Gigantes e o Poço da Morte”, será que o animal não percebe a vista nocturna de luzes roxas e verdes reflectidas por entre o fumo das castanhas, será que o animal não percebe que uma estrutura como a feira popular tem que estar numa zona fora do centro histórico e de preferência moderna, será que o animal acha possível aproveitar o Champ-du-Mars (junto à Torre Eiffel em Paris) para roullotes de minis e diversões ruidosas. Que país é este em que inconscientes e idiotas conseguem ser presidentes da Câmara da capital.
Aproveito até para lhe dar mais uma ideia de aproveitamento, vejo o Terreiro do Paço tão desocupado que até se podia aproveitar para lá instalar a pista de carrinhos de choque, com uma ligação ao Jardim do Tabaco em passadeira rolante sobrelevada junto ao rio! E nem me apetece falar do túnel do Marqués, o que até é bom para não partir directamente para o insulto.
26.11.04
Insanidades III
Sanidade
Insanidades II
As mulas da maioria parlamentar, assustadas com a mera hipótese de o “Não” ter votos – apesar de apenas os partidos da extrema-esquerda terem esta posição – criaram um delírio frásico que nem os próprios entenderão. Continuo ingenuamente a acreditar que Democracia é o poder do povo, claro que as mulas não. Fazer uma pergunta tão europeia – aqui louvemos a coerência burocrática – implica que apenas estritas elites a possam responder em consciência, o que faz do referendo uma total inutilidade. Para decidir em “petit comité” decidam os deputados como o têm feito até agora em relação à “maravilhosa Europa”.
Imaginem só os habitantes de Carqueijas-de-cima – que já dificilmente percebem o que é a Europa – a votar na “regra das votações por maioria qualificada” – “Oh! Menina, maioria eu sê o que é, agora qualificada só me alembra do mê clube na Taça. O que é que isso têm a ver com Europa”
A alucinação tomou conta do parlamento e, ou eles enlouqueceram, ou perderam toda a vergonha de manipular a opinião pública, ou andam a distribuir erva da boa pelos corredores de São Bento.
Aqui vai-se votar não, independentemente da pergunta esta gente tem de ter um sinal. Como diriam os nossos revolucionários “Há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz Não”.
Insanidades I
As duas últimas semanas trouxeram consigo uma alucinante sucessão de disparates que me fazem duvidar sobre uma revolução “Monthy Phythoniana” no nosso país. Antes assim fosse pois seria inconsequente e muito mais divertida.
A tontaria é tanta que nem a consigo resumir numa posta, segue-se então uma série sobre o que me leva a olhar para uma clínica de repouso na Suiça como uma solução para mim, ou para “os outros”.
18.11.04
Sítios
“Hoje presenciei o enterro de alguém que nasceu, viveu e morreu numa casa velha.
A velhice das casas embora seja muito incómoda tem o seu significado e daí a sua felicidade.
A estética, a vivência e os cheiros de uma casa velha não se explicam, sentem-se, saboreiam-se e vivem-se.
Eu também tenho a sorte de ter uma casa velha, onde a passaram os meus bisavós, avós, tios e mãe, e onde ainda posso encontrar vestígios da sua presença e da sua maneira de ser.
Mas esse alguém cujo enterro presenciei teve outra grande felicidade, a sua morte foi celebrada numa igreja velha e com as vozes dos seus irmãos e sobrinhos.
Não imaginam o amor e a ternura que pode transparecer dumas paredes velhas com caliça a cair.
Não há de facto sítio com melhor acústica.
Na verdade até as tomadas já nem deixam entrar as fichas dos aquecedores modernos que ajudei a arrumar para que não sentíssemos o frio e a humidade daquele sítio velho.
Quando morrer espero que ainda hajam igrejas velhas para poderem celebrar a minha morte, e vozes da minha família para cantarem a subida da minha alma ao céu (ou ao inferno!).”
Lenços de pano
Acredito que esta posta e a anterior sirvam para um imediato carimbar da minha pessoa como um perigoso reaccionário provinciano de cinquenta e tal anos. Tudo errado, mas enfim!
Continuo persistentemente a usar lenços de pano, acho mais bonito, mais agradável ao assoar, mais personalizado nos seus monogramas. Hoje já percorri várias cores, desde os usuais brancos até aos mais esporádicos azuis, recorri ainda a um verde militar de tamanho XL usado quando o desespero surge. O problema é quando as constipações ou ataques de rinite alérgica chegam em força. No caso de agora, em que começo a desesperar pois o monte que está na gaveta começa a descer impiedosamente, mais, tenho de começar a usar os de algodão mais áspero, aqueles que se evitam até ao fim devido aos perigosos efeitos secundários que envolvem narizes ardidos e uma espécie de cieiro nasal que dura como uma pilha Duracell. Usar lenços de papel, pois sim, de vez em quando e com nariz quase em sangue lá cedo, mas só mesmo de vez em quando. Qual Velho do Restelo não abdico das minhas idiossincrasias, e – desculpem, mas tenho de ir buscar mais um pois a torneira nasal reabriu - assim insisto neste hábito que já vai sendo visto de soslaio, como um resquício de viveres arcaicos e desadequados.
Feiras
Cedo me habituei a dividir o ano em etapas, em marcos que pautavam o avanço do tempo, isto no tempo em que ainda queríamos que o tempo corresse. O verão na Figueira e o S. Martinho na Golegã eram em definitivo o ameaço de um Natal próximo, do final de mais um ano. Não sendo criatura de grandes hábitos, pontualidades ou rigores, respeito ainda hoje estes marcos, que como outros me ajudam a passar o ano, a dividi-lo não em meses mas em acontecimentos, não na científica medida dos dias mas em horas passadas em locais previsíveis e de maneiras repetitivas.
Voltando ao fim de semana e voltando, uma vez mais, à Golegã, a minha romaria foi a habitual. Em redor a costumeira multidão, mas onde dantes passeavam cavalos e trajes curtos, agora surgem adolescentes cambaleando ao ritmo do álcool. Sempre foi local de copos, de grandes e históricas bebedeiras, de confusões e pancadarias, mas entre poucos, sempre os mesmos. Os cavalos, afinal sempre o motivo da feira, são cada vez menos, cada vez mais mal montados, rareando como o oxigénio. A feira de vaidades que começou há uns anos, com a praga incontrolável dos acolchoados, encerados e afins, foi hoje substituída por um generalizado estilo desportivo e uma réstia de clássicos capotes e samarras. Agora invasão é outra, depois dos novos-ricos de Lisboa que achavam necessária a sua presença – mesmo sem saberem o que é um cavalo – que deambulavam com os seus trajes de campo, como imagens tiradas de caçadas retratadas nas “Holas” do momento, novos, sempre novos pois apenas eram usados nesta ocasião. Demasiado campestres e populares para outras ocasiões. Os “magníficos” anos do cavaquismo trouxeram esta fase da Golegã, a fase em que a “manga” mais parecia uma passerelle em que senhoras de penas de perdiz em chapéus de feltro e casacos austríacos passeavam enquanto olhavam visivelmente enojadas com a presença de cavalos que, incomodativos, teimavam e circular pelas ruas e, imagine-se a indignidade, atreviam-se a sujá-las. O desprezo de alguns pelo evento começou aqui, e compreende-se.
Hoje são os bárbaros “teenagers”, fartos das noites citadinas, que sobem ao campo com o digno, e edificante, propósito de beber até à morte, ou, sem exagero, até cair. Onde antes pontuavam forcados provocadores e quantas vezes violentos, estão hoje “pseudo-surfistas”, “dreads” ou “skaters” num aparente erro de “casting”.
Pouco democrática é o que parecerá a alguns toda esta verborreia. Não será essa a ideia, mas para quem se habitua a certos rituais e os olha como assumido conservador, o destruir do nosso imaginário é sempre algo que nos revolta. Acho muito bem que todos possam fazer o que lhes apetece, agora reservo-me o direito de não gostar que essa liberdade choque com a minha, assumo que restritiva, liberdade. Claro que apesar de tudo isto teimo em cumprir o ritual, em reencontrar amigos muitas vezes esquecidos, em passar divertidas noites com longas conversas regadas a água-pé (quando se descobre alguma boa) por entre a neblina das castanhas assadas, em ver belos cavalos passeando na manga, em ver – quando consigo – a derriba na festa de campo, em passar horas de genuína diversão, em ver magníficas meninas de samarra e com ar desempoeirado isto, é claro, apesar das invasões dos bárbaros.
17.11.04
Cabala
15.11.04
S. Martinho
Sporting II
11.11.04
Tarde
9.11.04
Sporting
Consta que o Sporting jogou ontem nas Antas (perdão, no Dragão). Não dei por isso. Houve de facto uma equipa de verde e branco que se passeou com calma e aparente serenidade pelo relvado, sem garra. Houve uma equipa que olhou impotente para um claro domínio dos azuis. Não me parece no entanto que fosse o Sporting.
Sempre achei que a negação era uma forma fácil de não ficarmos irritados.
5.11.04
Bush
O mundo pode indignar-se, mas a democracia mostrou que apesar de tudo não é assim tão manipulável e que o Quarto Poder ás vezes é fraco. No outro dia, José Manuel Fernandes perguntava em entrevista a António Barreto se ele se sentia – como comentador – mais poderoso do que um Ministro, a resposta de Barreto foi negativa. Os americanos nestas eleições responderam também negativamente a essa mesma questão. Podemos gostar ou não, concordar ou não, mas as eleições americanas foram uma vitória dos eleitores simples contra a Opinião politicamente correcta.
A Europa tem medo de Bush, e para a Europa o problema era entre Bush ou Kerry. As eleições americanas têm de facto uma influência indesmentível no mundo actual. Para mim no entanto a questão não era entre os dois candidatos, ou o perigo de Bush, a questão era como é que deixámos que o mundo seja tão dependente dos americanos que encaramos umas eleições nacionais como um problema mundial. A questão é pensar porque é que os E.U.A. são hoje de facto a “Grande Potência Mundial” e pensar se é isso que de facto queremos. Porque se calhar o ideal era que as eleições americanas mais não fossem que um distante fait-divers político nacional.