27.3.07

Ota II

Quanto mais se fala da Ota mais se percebe a cegueira e fraqueza de argumentos de quem a defende.

Grandes Portugueses IV

Terá sido impressão minha ou Odete Santos coçou animadamente o soutien durante o programa? E era bege.

Grandes Portugueses III

A indignação geral parece ter ficado pelo primeiro lugar, pois parece ser perfeitamente normal que Cunhal tenha vinte por cento dos votos e fique em segundo. A importância desse grande português ficou expressa no comentário final de Odete Santos: “Isto é uma apologia do fascismo o que é proibido pela constituição”. A censura para esta gente só é má quando vai contra os seus interesses, poucas frases serviriam tão bem para explicar que, em matéria de liberdade, Salazar e Cunhal são duas faces de uma mesma moeda. E eu que teimo em me maçar terrivelmente com esta moeda.

Grandes Portugueses II

A conclusão do concurso é que Salazar ganhou, em grande parte, devido ao salazarismo da RTP que excluiu o seu nome da lista inicial, ao mesmo tempo que incluía gente igualmente infrequentável como Cunhal. A partir daqui foi uma avalanche de votos úteis para impedir que ganhasse Salazar ou Cunhal. Talvez Rosado Fernandes tivesse razão ao dizer que foi um voto de protesto no triste Portugal pós-Abril, mas mais triste ainda é verificar que tanta gente dá importância ao nosso miserável século vinte, cem de anos dos quais temos motivos para ter a maior das vergonhas.

Grandes Portugueses II

A conclusão do concurso é que Salazar ganhou, em grande parte, devido ao salazarismo da RTP que excluiu o seu nome da lista inicial, ao mesmo tempo que incluía gente igualmente infrequentável como Cunhal. A partir daqui foi uma avalanche de votos úteis para impedir que ganhasse Salazar ou Cunhal. Talvez Rosado Fernandes tivesse razão ao dizer que foi um voto de protesto no triste Portugal pós-Abril, mas mais triste ainda é verificar que tanta gente dá importância ao nosso miserável século vinte, cem de anos dos quais temos motivos para ter a maior das vergonhas.

Grandes Portugueses I

Este fim-de-semana os grandes portugueses estavam nas Selecções Nacionais de Futebol e Rugby. A primeira fez uma belíssima segunda parte e massacrou com arte (ai o golo do Quaresma!) os toscos belgas; a segunda conseguiu tornar-se a única selecção amadora a participar na fase final da Taça do Mundo de Rugby. É caso para dizer: “Brava Dança dos Heróis”.

Admirável Governo Novo – Obras Públicas

O ministério dos projectos estruturantes teve o rasgo de apresentar dois projectos de unidade nacional, a OTA e o TGV. A Ota foi o mais ponderado e estudado projecto deste governo, anunciado como um compromisso político do mesmo e pessoal do ministro. Foram inúmeros os estudos comparativos com outras localizações e vastas as análises de cenários alternativos, sendo que após longa ponderação se chegou à Ota. Não é perceptível a crítica, que se começa a generalizar, de que o projecto foi anunciado antes de ser estudado, pois o ministro não iria, por certo, incorrer em tão bárbaro erro. Critica-se também a posse dos terrenos onde o aeroporto será construído – que muitos dizem ser de gente ligada ao PS ou a grupos de pressão ligados ao partido –, crítica soez a que o governo bem fez em nem sequer lhe dar resposta, ignorando olimpicamente todos os boatos sem esclarecer o facto. Quanto ao facto do aeroporto esgotar a sua capacidade em vinte anos, é facto de menor importância perante a relevância do Projecto.
O TGV foi algo incompreendido pela população, pois será uma obra vital para ligar o país, nomeadamente os grandes centros que são os que interessam. A queda do comboio na linha do Tua demonstrou, uma vez mais, que o interior deveria ser abandonado e que o TGV será um óptimo veículo para uma maior litoralização do país em grandes centros urbanos. A ligação a Espanha é apenas um pretexto, pois o mais importante é ganhar meia hora no trajecto Lisboa-Porto, tempo que justifica plenamente os milhares de milhões a investir no projecto.

23.3.07

Mentir

Diz que Sócrates afinal não é Engenheiro, parece que a teia da Universidade Independente destapou um erro no curriculum no nosso primeiro-ministro que se intitulava de algo a que não tinha direito. Perante o silêncio dos jornais, a blogosfera fervilha de comentários sobre o assunto. Para mim é indiferente que o homem tenha ou não um canudo, pois esta obsessão portuguesa pelos títulos – por certo reminiscência de um problema mal resolvido com a ausência de monarquia e dos títulos nobiliárquicos – passa-me muito ao lado. O que não podemos esquecer é que, a ser verdade o que se diz, alguém incluiu no curriculum do homem algo a que não tinha direito e isso, independentemente das voltas que dêem ao assunto, é mentir. Ora, apanhar um primeiro-ministro numa clara mentira já me parece de invulgar importância. Quantas pessoas poderiam perder o seu lugar de trabalho por mentir no curriculum? A questão não é se o homem tem ou não canudo, a questão é que ele, ou alguém por ele, mentiu, e isso é grave.
Agora que parece perder o título ficamos sem saber como nos dirigir ao homem, continuaremos a usar o segundo nome próprio (Sócrates) – estilo senhor João, o homem do talho – ou passaremos a usar os apelidos para o tratar por senhor Pinto de Sousa?

22.3.07

Admirável Governo Novo – Cultura

A cultura é a área que gostaria de destacar como uma das mais importantes e conseguidas neste governo. A ministra da tutela tem passeado a sua enorme craveira intelectual e faro político conseguindo um mandato até agora digno dos maiores aplausos. A “grande obra” que foi conseguir alugar, por um preço um pouco elevado – é um facto –, a colecção de arte contemporânea do grande mecenas Berardo, destinando-a ao CCB, tornou-se o farol da sua actuação, numa medida que ainda por cima esgota a subaproveitada capacidade do CCB, facilitando assim a sua gestão com uma colecção permanente. A decisão foi corajosa, especialmente num ministério onde não abunda dinheiro – apesar do pagamento das jóias roubadas na Holanda – e onde os museus (de Arte Antiga e do Azulejo) têm alas fechadas por falta de dinheiro para pessoal. Finalmente temos um Ministro da Cultura que dá o adequado relevo à modernidade, mesmo que para isso tenha de ir contra “Vacas Sagradas” e “Velhos do Restelo” que insistem, disparatadamente, na importância do património histórico.
No capítulo das artes a ministra teve ainda duas intervenções vitais para o país: despedir Paulo Pinamonti, o director do Teatro S. Carlos que insistia em o tornar europeu esquecendo “a prata da casa” que tão bons resultados havia apresentado nos anos anteriores, optando assim por um teatro de ópera mais nosso e menos pretensioso; a gestão do caso Rivoli, um exemplo de compreensão perante os protestos de uma grande companhia de teatro que se viu sem os apoios, a que indiscutivelmente tem direito, para fazer teatro de vanguarda. A importância para o país da sobrevivência do teatro independente é enorme, e as críticas por falta de público uma óbvia barbárie intelectual própria de países subdesenvolvidos.

A arte do toureio

O genial Rafael de Paula, ou como tornar o toureio numa dança de coreografia imprevisível.

21.3.07

Pais (des)ordenado

Anda tudo muito admirado e chocado com o avanço do mar nas zonas da Caparica, assim como se admiram com as cheias ou com os gigantescos fogos por este país fora. A ninguém ocorre que a culpa não é do pobre mar, que tão agradavelmente nos banha nos dias de verão, mas da cambada de irresponsáveis que nos desgoverna há demasiados anos com uma criminosa política de desordenamento do território. Os mesmos que agora se indignam com os prejuízos – e atiram responsabilidades para outrem – são os mesmos que em nome do desenvolvimento, palavra sagrada que veneram, têm cometido as maiores atrocidades pelas terras deste país. Atirar com empregos para a população, mesmo que normalmente vinda de fora, é quase sempre argumento seguro para infringir as leis e construir, modificar ou destruir. O país por infelicidade não pode falar, gritar ou urrar de dor, e assim se vai arrasando com o que resta, com a displicência de quem espanca a mulher e a seguir se senta a beber um sossegado café. Depois a culpa é do mar, do sol, do vento, das intempéries, de tudo o que não tenha factor humano, pois esse, para estas criaturas, é sempre perfeito.

Admirável Governo Novo – Saúde

O excelente Correia de Campos tem conseguido, com a sua enorme humildade e capacidade política, explicar com brilho as complexas medidas de fecho de urgências e centros de saúde. A subtileza é tanta que para até aproveitou para, por clara coincidência na fase de maior contestação, fazer aprovar em conselho de ministros a muito equilibrada e sensatíssima lei da proibição do fumo que consegue – finalmente – tratar os fumadores como delinquentes sociais que importa, a todo o custo, marginalizar.

Admirável Governo Novo – Agricultura

O ministro Jaime Silva destaca-se, ainda mais do que pelo maravilhoso conteúdo, pela forma adequada que usou para contactar com esse rude sector da sociedade que são os agricultores. O seu maior mérito foi ter conseguido criar uma total incompatibilidade com as pessoas mais essenciais na agricultura, os agricultores, proporcionando assim as melhores condições para gerir e planear este difícil sector.

20.3.07

Admirável Governo Novo – Educação

“Todo o dinheiro é pouco para a Educação” – dizia ontem Sócrates numa importante declaração que vai de encontro aos desejos do país, mais importante ainda quanto, finalmente, temos um governo que parece ter as prioridades bem definidas: é preciso investir na educação, investir muito mesmo, mas apenas nos grandes centros urbanos, pois o interior, onde continuam a fechar escolas, é algo a abandonar o mais depressa possível. Louve-se a grande coerência e visão estratégica da medida.
A educação é também a área onde o governo sofreu um infeliz revés, ao recuar na sua mais brilhante e visionária proposta, após disparatada contestação da grande parte da sociedade. A TLEBS era mecanismo fundamental para o programa de reeducação das nossas crianças, criando uma nova e moderna gramática, essencial à competitividade do país no estrangeiro e à adequada evolução da língua portuguesa.

Admirável Governo Novo

Passados dois anos podemos tecer grandes loas ao governo Sócrates. Reformismo, competência, modernidade, estas e muitas outras características que o governo tem passado como suas e fazem com que aos olhos dos portugueses este seja o melhor governo dos últimos anos. Um governo coeso, sem divergências, que fala a uma só voz, discreta pela escassez de vezes que Sócrates sai do seu resguardo. Regozijemo-nos com o privilégio de poder contar com tão Grande Timoneiro para um país à deriva. Nem as disparatadas manifestações de trabalhadores conseguem apagar a boa imagem e o bom trabalho, aliás, dizem que a última foi a maior manifestação de que há memória nos últimos anos, esquecem o magnífico dia de sol em que calhou, no qual as pessoas resolveram sair à rua e os números por certo foram inflacionados por populares que aproveitaram o facto das ruas estarem cortadas para passear pelo belo centro de Lisboa. Esquecendo a, aparente, contestação, a grandeza do governo é tanta que até justifica que se destaquem alguns dos mais importantes comandantes com que o Timoneiro pode contar para as diversas áreas de intervenção.

Clube de Destruição Sumária / Para o Próprio

Serão precisas palavras para descrever o que se passa no CDS/PP.

19.3.07

Escuro objecto de desejo

Que por mui generosa oferta me chegou ás mãos. Agora falta fazer parte do clube das balas para me sentir realmente moderno.

14.3.07

Mediocridade

Parece que se confirma o despedimento de dois Paulos, o Macedo e o Pinamonti, em mais um atestado de mediocridade do nosso Estado. Ninguém é insubstituível, mas não deixa de ser curioso que duas pessoas que se destacaram pela sua inegável competência sejam dispensadas. Podem ser muitos os motivos, mas numa Administração tão cheio de incompetentes é um enorme desperdício perder gente capaz de fazer um bom trabalho. Num caso invejas financeiras, no outro invejas artísticas, em ambos a recusa dos componentes do “Monstro” em aceitarem a competência.

Boa companhia para jantar


Katharine Hepburn

Ser agradável

«Ao olhar para o passado sinto que a nossa casa era de facto um lar feliz. Isso devia-se em grande parte ao meu pai, pois tratava-se de um homem agradável – qualidade, aliás, pouco significativa hoje em dia. Actualmente as pessoas interessam-se mais em saber se um homem é inteligente, se é trabalhador, se contribui para o bem-estar da comunidade, se ele “conta” no esquema geral. Charles Dickens, porém, trata esse assunto de uma maneira deliciosa em David Copperfield:
“– O seu irmão é um homem agradável, Peggotty? – inquiri cautelosamente.
– Oh! O meu irmão é um homem muito agradável! – exclamou Peggotty.”
Pergunte a si própria se a maioria dos seus amigos e pessoas conhecidas são agradáveis e ficará surpreendida por tão poucas vezes a sua resposta poder ser igual à de Peggotty.»

Agatha Christie in “Autobiografia”

12.3.07

Sábado glorioso

Uma luz quase obscena proibia a estadia em casa, o corpo pedia sol, enferrujado que estava pelo longo Inverno a que nós portugueses teimamos em não nos habituar. A praia era opção óbvia, nem que fora para uma estadia longa e dolente numa esplanada com o mar ao fundo, pilhas de jornais ou uma boa companhia. A opção foi contudo outra, uma vez que a Selecção Nacional de Rugby jogava a primeira-mão do apuramento para o Mundial contra o Uruguai.
Faz tempo que não ia ao Estádio Universitário e foi com enorme agrado que fiz por entre as sombras de belas árvores o caminho desde a Reitoria. Junto ás bilheteiras, e apesar de faltar uma hora para o jogo, já reinava grande animação, com grupos a aproveitarem a esplanada para almoçar e crianças, muitas crianças, a brincarem em redor, algumas delas ainda equipadas de um treino ou jogo de rugby já decorrido. Não parecia Portugal, definitivamente não parecia o Portugal que se fecha nos centros comerciais de onde apenas sai para a praia, não parecia o país em que os jardins estão vazios e onde é raro encontrar carrinhos de bebé a passearem ao ar livre. Havia calma e alegria no ar, uma tranquilidade de fim-de-semana e uma boa disposição obrigatória perante o sol radioso que brilhava por todo o lado e que tudo fazia brilhar.
O jogo aproximava-se e foi com surpresa que deparei com o estádio cheio, e que visão magnífica a de um estádio rodeado de belas árvores e de sebes bem aparadas, bancadas cheias, e a luz… Habituámo-nos aos estádios de betão, encaixados nas cidades, rodeados de prédios, com centros comerciais, mas aqui tudo é diferente. Claro que não tem a segurança necessária a jogos de futebol, mas até essa necessidade de segurança muito diz da diferença entre estes dois desportos. Um olhar pelas bancadas mostrava famílias inteiras, com as crianças a brincar junto ao relvado, sem qualquer fosso que os separasse do campo onde, minutos depois, iria decorrer o jogo.
A selecção entrou perante enorme ovação e o hino foi cantado a uma só voz em todo o estádio. Bonita recepção ao jogadores que durante o jogo mais do que fizeram por a merecer. O jogo foi equilibrado, em especial na primeira parte que acabou zero a zero, mas no segundo tempo os portugueses encheram-se da enorme garra que vêm mostrando e conseguiram dois ensaios, um deles concretizado, e a diferença de doze pontos. Seria uma excelente vantagem para a segunda mão, não fora um ensaio, não concretizado, dos uruguaios no último minuto. Os sete pontos são apertados, mas deixam esperança para a segunda mão em Montevideu, deixam esperança a uma selecção que merece a histórica oportunidade de ser a única selecção amadora a estar presente no Mundial.
O final trouxe uma pacífica invasão de campo e foi divertido ver os jogadores a darem autógrafos submersos por miúdos ou a ficarem junto ás bancadas a conversar com amigos ou família, tudo com enorme calma e familiaridade. Aqui respira-se desporto – competitivo, mas desporto – longe do espectáculo distante e inacessível de outras modalidades, cada vez mais indústrias com operários especializados pagos principescamente. Não tenho nada contra outros desportos, até segui para Alvalade para ver o Sporting contra o Estrela da Amadora, mas tudo aqui é diferente, e de uma diferença muito agradável.
Pedro Leal (2), David Mateus, Miguel Portela, Diogo Gama (5), Pedro Carvalho, Cardoso Pinto (Gonçalo Malheiro), Luís Pissarra (José Pinto), Vasco Uva, João Uva (Paulo Murinello), Juan Severin (Diogo Coutinho, 5), Gonçalo Uva, Marcello D’Orey (David Penalva), Joaquim Ferreira, João Correia e André da Silva.
Esta foi Selecção Nacional de Rugby que jogou no Sábado, treinada por Tomaz Morais, e que ganhou ao Uruguai. Estes, e outros que neste jogo não jogaram, formam um grupo que tornou uma selecção de terceira categoria numa equipa de nível tal que já ganhou o Torneio das Seis Nações B (o acesso ao outro é por convite), vários torneios e campeonatos de Sevens (rugby de sete) e que pode agora ser apurada para o Mundial. Todos são amadores, todos treinam com sacrifícios imensos para conseguirem conciliar empregos, famílias e o seu desporto, todos jogam com grande espírito de grupo, todos mostram um enorme amor à camisola. O desporto amador quando consegue ser competitivo é algo de magnífico e aqui o grande papel é do seleccionador Tomaz Morais que conseguiu transformar a nossa selecção numa selecção de campeões. Podemos até não conseguir o apuramento – o que seria injusto para o esforço da equipa – mas esta selecção, esta “Nossa Selecção”, está de parabéns pela atitude e, é preciso não o esquecer, pelo seu excelente rugby.

8.3.07

RTP

A gala de comemoração dos 50 anos da RTP, que ontem decorreu, foi um agradável regresso ao passado da televisão e, consequentemente, de nós mesmos. O estilo do espectáculo foi o mais genuíno RTP, ou seja, popularucho sem chegar ao quase kitch com que a TVI nos brinda nas suas galas. Houve uma certa dignidade muito própria da RTP, quer nos sóbrios cenários, quer na concepção geral do espectáculo. Não foi nenhum deslumbre, mas só o facto de relembrar os anúncios do “Leite de Colónia” ou do “Restaurador Olex”, a “Vila Faia”, o “Vitinho”, várias músicas da minha vida – a da “Heidi” e a do “Dartacão” – ou de aparecerem personagens que julgávamos desaparecidos em parte incerta – Eládio Clímaco é o melhor exemplo – já valeria a pena acompanhar o programa. Eu diverti-me muito e dei por mim a rir com um agrado cada vez mais raro, ainda que uma pontinha de nostalgia me fizesse pensar que o tempo passou e não foi só pela televisão.

6.3.07

Abandono

Este blog é discreto, mas ontem, ao abrir o Sitemeter e deparar com zero visitantes, achei que tinha sido abandonado pelos meus, poucos, leitores fiéis. Teria escrito algo que desse direito a tal indignação, a tal fuga em massa, a tal desprezo? Quase chorei, cheguei mesmo a ter o meu lenço de pano na mão, até que, num lapso de narcisismo e recusa perante a realidade, naveguei pelo Sitemeter em busca de uma qualquer explicação. O lenço foi guardado quando descobri que um servidor do site tinha dado o berro, suspendendo temporariamente o serviço. Fiquei de imediato mais bem disposto ao saber que afinal não tinha sido vítima de um trágico abandono, mas sim arrastado numa avaria informática com muito desagradáveis consequências.

Santa Comba e Estaline

Haverá ainda paciência para as discussões idiotas à volta de Salazar? Se há gente que quer fazer um museu em homenagem ao homem, não encontro razão nenhuma para que o não façam. O “Avante” existe e veicula ideias muitas vezes próximas do estalinismo, mesmo assim é aceite e seria considerada uma heresia censória que se tentasse acabar com ele. As gentes de Santa Comba simpatizam com Salazar e logo aparecem manifestações em nome de uma suposta liberdade, provavelmente organizadas por assinantes do dito jornal.
A mostarda chega-me cada vez mais facilmente ao nariz neste país em que os idiotas conseguem tempo de antena e põem à prova os meus instintos democráticos, tanta é a vontade de os meter na choldra para não maçarem mais. Era bom, se bem que utópico, que a populaça fosse educada a perceber que Salazar foi um ditador, é um facto, mas que o comunismo defende uma outra forma de ditadura, a do proletariado. Um e outro estão no mesmo exacto patamar para quem defende, de facto, a liberdade e a democracia, são ambos representações de regimes ditatoriais. Enquanto se julgarem por patamares diferentes as ditaduras, de direita ou esquerda, e os seus apoiantes não teremos sossego. E não chega o dia…

2.3.07

As palavras de…

Ferreira Fernandes in “Sábado”, 1 de Março de 2007.

“Estava a África do Sul a viver a sua viragem histórica, eleições com brancos e negros, quando me encontrei com um jovem admirável. Ele era branco, bei­rão e vivia em Durban, num bairro operário e negro. Aquela zona era zulu, uma minoria negra com um partido que se opunha ao ANC de Nelson Mande­la. No bairro, todas as manhãs apareciam cor­pos de xhosas e zulus, mortos a tiro e por vezes torturados. O meu jovem, que era mis­sionário, ensinava a ler nos dormitórios das fábricas e treinava uma equipa de futebol com os miúdos do bairro.
Eu tenho o que julgo ser uma reacção alérgica benigna. O que leva outros a terem erupções cutâneas por comerem camarão, a mim, perante um tipo admirável, põem­-se-me a brilhar os olhos. O rapaz viu. E en­tendeu que aquela homenagem se devia ao facto de eu o tresler. Onde eu via fraternida­de, o que o motivava era outra coisa: "Olhe que eu estou aqui por razões de fé."
Sorri e continuei com o brilhozinho nos olhos. Os caminhos do amor aos homens são insondáveis. A generosidade escreve di­reito por linhas tortas. O que quiserem. O jo­vem beirão tinha abandonado a sua terra e os seus, corria riscos e praticava o bem. O motor da sua humanidade, segundo ele, ali­mentava-se com uma gasolina que eu des­conhecia, a fé. Nas tintas. Para mim, o que era importante é que ele era dos meus. Des­culpem-me, desculpem-me, a presunção da frase anterior. O que eu quero dizer é que gostaria de ser dos dele.
Vai para aí uma polémica sobre um túmulo de Jesus que poria em causa alguns dog­mas do cristianismo. Ele não ressuscitou e teve um filho? Eis, mais uma vez, o que me deixa indiferente. O meu brilhozinho nos olhos por essa pessoa generosa e fraterna que foi Jesus Cristo – virado para todos os homens e não só para os eleitos, respeita­dor dos mais fracos, igualizador dos géne­ros, político moderníssimo ("Dar a César...") – continua cintilante. Seja, ele não foi Deus. Não me importa, tenho uma versão para ele ainda maior.”

Sobre a Goa de hoje

Ler em “A Vida em Deli”.

1.3.07

O fascismo está a chegar

O conselho de ministros aprovou a nova lei do tabaco.

A propósito de criadas

No Corta-Fitas decorre um importante polémica sobre criadas, assunto deveras inquietante e que, pelos vistos, gera revoltas graves em algumas pessoas. Como se dá a coincidência do meu livro de cabeceira ser a “Autobiografia” de Agatha Christie deixo aqui dois excertos a propósito:
“Duvido que hoje exista ainda uma verdadeira empregada doméstica. Existirão possivelmente algumas, entre as idades dos 70 e 80 anos, mas, fora disso, o que existe são diaristas, empregadas que parecem fazer-nos favores, ajudantes domésticas, governantas e encantadoras jovens que pretendem conciliar o ganho de algum dinheiro extra com um horário que lhes convenha e convenha também ás necessidades dos seus próprios filhos. São amadoras gentis; frequentemente tornam-se nossas amigas, mas é raro que inspirem o respeito com que olhávamos os nossos empregados domésticos de antigamente”
“Uma criança que passou algum tempo na nossa casa foi um dia surpreendida pela minha mãe a dizer a uma das suas empregadas: – Você não passa de uma empregada! – e foi de imediato severamente repreendida.
– Espero nunca a ouvir falar desse modo com uma empregada. Os empregados devem ser tratados com a maior cortesia. Fazem um trabalho especializado que não saberia fazer senão depois de longo treino. E lembre-se também que não podem responder do mesmo modo.”