28.7.04

Fogos III

Como resolver este problema crónico é algo que ninguém sabe com certeza, até porque enquanto houver floresta vamos ter fogos, o que se pode é conseguir que a sua extensão seja menor, que os estragos sejam minorados, que se extingam em tempo útil e não quando o que resta é deixar arder pois já não há mão neles. Toda esta realidade escapa aos burocratas que nos governam. O principal responsável por tudo isto mais não é do que a política de Desordenamento do Território que Portugal tem seguido em anos e anos seguidos, atravessando governos e presidentes de Câmara mais preocupados em saber onde podem construir mais casas ou estradas, onde vão por a próxima barragem ou o seguinte campo de futebol. Não é possível fazer frente aos fogos com um país retalhado a betão e em que os agricultores ou silvicultores são considerados exóticos, apenas seres alucinados que insistem em viver da terra. Um país onde é sempre possível construir, nem que seja em RAN ou REN (independentemente de estas serem questionáveis são dos poucos instrumentos que dispomos).
Os campos sujos, rastilho de quase todos os fogos, e o errado planeamento florestal, cada vez mais assente no milagroso eucalipto, em muito contribuem para o desastre. Os proprietários são também responsáveis, assim como já se fazem obras coercivas por decisão das câmaras, o mesmo deviam fazer no que à limpeza dos campos e à realização de aceiros diz respeito. Os proprietários choram dizendo que não têm dinheiro para limpar o mato, mas são os primeiros a correr ao subsídio mesmo que com a falta de limpeza tenham ajudado a arruinar os vizinhos. Não conseguem por mesquinhez compreender que a limpeza custa X, mas se um fogo passar terão prejuízos de 100X, continuando numa mentalidade retrógrada que tanto tem ajudado a arruinar a exploração do espaço rural português.
Os bombeiros, os pobres bombeiros que sempre servem de bode expiatório, seja por demorarem a chegar, seja não saberem combater os fogos, seja por estarem descoordenados, seja por falta de meios. Os bombeiros são talvez a profissão que mais admiro, em especial os voluntários que estão ali a dar a vida – sim, quantos morrem a cada ano que passa – não pelo dinheiro, não por uma carreira, não por promoção social, apenas para nos ajudar, para ajudar um país que não os ajuda, que continua a preferir comprar F16 a comprar mais Cannadair, que prefere metralhadoras, apesar de obsoletas, a mangueiras, que prefere carros topo de gama todos os anos para os directores gerais e em que não há dinheiro para auto-tanques (não, não é uma divagação demagoga de esquerda, é a realidade). Todo o dinheiro seria pouco para pagar um corpo de bombeiros a sério em que, mais do que a (enorme) boa vontade dos bombeiros, os meios fossem pelo menos em metade da qualidade das pessoas. Claro que erram, mas quantas vezes por uma desorganização dos comandos que têm nas mãos ás dezenas de corporações. Continua a ser ridículo que os militares não patrulhem as florestas, não digo apagar os fogos pois isso requer conhecimento e excede as suas competências, mas fazer patrulhas por esse país ajudando a detectar prontamente fogos em vez de brincarem aos tiros nos quartéis fingindo que matam inimigos imaginários com G3 ferrugentas e boas para o caixote do lixo.
Portugal enquanto não tomar os incêndios como a sua guerra e se perder em jogos florais de submarinos e ordenamento selvagem será irremediavelmente um país do terceiro mundo. Fogos sempre houve e continuarão a haver, haja calor e criminosos acendedores, o que podemos e devemos por obrigação moral é fazer com que sejam detectados e apagados de pronto, minorando assim a devastação que por vezes se dá por atrasos de minutos.

Sem comentários: