José Pacheco Pereira in “Sábado”, 22 de Fevereiro de 2007
“Poucos sítios mantêm a paisagem natural rude e agreste, bela ao modo do "terrível", como os vales dos afluentes do Douro, rio de montanha rodeado por rios de montanha, que fizeram o seu leito cavando rochas e não espraiando-se por terras baixas irrigadas. O vale do Tua é um desses casos de beleza, ignorado, perdido, numa parte de Portugal que a maioria dos portugueses nem sabe que existe.
Mas, não tenhamos ilusões, a sua beleza selvagem só tem uma explicação, a de não ter havido até agora nenhum negócio rapace que tornasse o vale numa selva de empreendimentos e as cumeadas em enxames de eólicas. É natural que este seja o desejo dos locais, que precisam de emprego, negócio, comércio e riqueza e que, como uma vez me disse um velho de um desses locais prístinos, "não percebo porque gosta disto, são só montes, estamos fartos de só ver montes, que interesse têm?". A verdade é que, se for assim, nem o pouco que têm em potência vai sobrar em acto. Gastar-se-á em meia dúzia de anos. Porque o nosso problema é que passamos sempre do oito para o oitenta, do nada miserável do atraso para o novo-riquismo da combinação construção-turismo barato subsidiado-obras públicas.
E no meio do caminho da sua vida, como Dante à entrada do Inferno, lá continuará o vale do Tua, com a sua linha de "metro" que transporta meia dúzia de pessoas ao dia, de lado nenhum para lado nenhum, num sítio tão remoto e deserdado de tudo menos da beleza que nem um responsável dos comboios achou necessário ir lá para honrar os seus mortos, os mortos da empresa que "gere". Retirado o último morto das águas, o silêncio voltará, se calhar também já sem o "metro" de Mirandela.”
“Poucos sítios mantêm a paisagem natural rude e agreste, bela ao modo do "terrível", como os vales dos afluentes do Douro, rio de montanha rodeado por rios de montanha, que fizeram o seu leito cavando rochas e não espraiando-se por terras baixas irrigadas. O vale do Tua é um desses casos de beleza, ignorado, perdido, numa parte de Portugal que a maioria dos portugueses nem sabe que existe.
Mas, não tenhamos ilusões, a sua beleza selvagem só tem uma explicação, a de não ter havido até agora nenhum negócio rapace que tornasse o vale numa selva de empreendimentos e as cumeadas em enxames de eólicas. É natural que este seja o desejo dos locais, que precisam de emprego, negócio, comércio e riqueza e que, como uma vez me disse um velho de um desses locais prístinos, "não percebo porque gosta disto, são só montes, estamos fartos de só ver montes, que interesse têm?". A verdade é que, se for assim, nem o pouco que têm em potência vai sobrar em acto. Gastar-se-á em meia dúzia de anos. Porque o nosso problema é que passamos sempre do oito para o oitenta, do nada miserável do atraso para o novo-riquismo da combinação construção-turismo barato subsidiado-obras públicas.
E no meio do caminho da sua vida, como Dante à entrada do Inferno, lá continuará o vale do Tua, com a sua linha de "metro" que transporta meia dúzia de pessoas ao dia, de lado nenhum para lado nenhum, num sítio tão remoto e deserdado de tudo menos da beleza que nem um responsável dos comboios achou necessário ir lá para honrar os seus mortos, os mortos da empresa que "gere". Retirado o último morto das águas, o silêncio voltará, se calhar também já sem o "metro" de Mirandela.”
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