Os centros urbanos parecem, depois do fecho das lojas, autênticas cidades fantasma. As cidades são feitas de gente, que nelas dorme e trabalha, se desloca e vive. É essencial que no centro haja movimento, moradores entrando e saindo de casa, entrando nos cafés de bairro após jantar.
A Baixa, centro oficioso de Lisboa, é, depois das oito horas, um deserto perigoso. Na última vez em que nela me passeava com os meus pais, detive-me numa montra e logo me ofereceram haxixe ou outras drogas e depois uma máquina fotográfica, obviamente roubada. Assim não dá.
O movimento dos habitantes, a certeza de que um grito é ouvido por alguém, que o vizinho de cima pode tomar conta da casa na nossa ausência. No fundo a sensação provinciana de viver numa comunidade que cada vez mais se perde nas grandes metrópoles. Em Lisboa ainda há zonas assim, como Campo de Ourique. Alfama e Graça são outro exemplo, onde o espírito ainda existe, talvez na sua forma mais pura, mas a degradação urbana toma, nalguns casos, proporções inacreditáveis. A reformulação urbana não se faz por decreto. Faz-se proporcionando o restauro dos edifícios, de preferência de forma rigorosa e respeitosa com a arquitectura dos mesmos. Não creio na transformação de bairros tradicionais nem em zonas "very typical" de matronas batendo em crianças à porta de casas miseráveis, nem em locais absurdamente caros que deturpam o conceito de bairro.
Parece utópico mas a cidade em que acredito é esta, com bairros mais caros e mais baratos, mas com uma alegre mistura, sem fronteiras rígidas, sem guettos falsos ou reais. Sem os condomínios fechados, que mais não são do que isto, falsos édenes, que em nada contribuem para a vida comunitária e que parecem uma versão capitalista de comunas fechadas ao mundo. Ainda não temos, felizmente, a criminalidade do Rio de Janeiro, essa sim justifica estes guettos. Lisboa foi assim, uma cidade de bairros, de pequenos provincianismos e saudáveis bairrismos, e pode voltar a sê-lo. A Graça sempre alternou casas populares com belos palácios, e Alfama, e a Madragoa. O bairro típico de Lisboa é assim, uma confusão de gentes e culturas. Assim se consiga manter o pouco que existe, sem estagnamos numa visão miserabilista de conservação degradada, ou embarcarmos em devaneios de construção em zonas sensíveis como estas.
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