4.12.08

Postal do Rio

Os contrastes de passar, no espaço de dois dias, de Ushuaia a Buenos Aires e depois para o Rio de Janeiro, baralha ambientações térmicas. O Rio recebeu-me com um sol inclemente e humidade no ar, suficiente para a praia ser um destino incontornável. A Prainha, afastada do centro, é um oásis de tranquilidade numa cidade buliciosa. Alguns surfistas e uma paisagem dominada pela natureza apenas quebrada por dois botecos. Calor e pele ainda clara a obrigar a cremes potentes e refúgios na sombra. A água gelada faz lembrar as praias do norte de Portugal, desmentindo mitos de água quente no Brasil. Manhã tranquila, o que não se pode dizer da tarde.
Destino Favela, Rocinha. Chegada de táxi a São Conrado onde é suposto apanharmos um moto-boy, motas que transportam passageiros na favela, que nos "suba" até ao boteco do Belo. Distribuímos o grupo - sim, porque aqui no Rio deixei de viajar sozinho - pelas motas e aí vamos. Desporto radical seria um eufemismo para descrever a inacreditável experiência de "trepar" pela favela de moto, com trânsito intenso na estreita rua de curvas em cotovelo, ocupada por autocarros, vans, carros e um enxame de outros moto-boy. Sempre em velocidade, ultrapassando o que aparecia à frente, curvas quase deitados, tangente a tudo o que mexe e não mexe, e em redor a favela. Demasiados momentos em que me julguei esborrachado no chão, no mínimo de joelhos esfolados. Nada aconselhável a cardíacos, nem a medrosos, nem a quase ninguém, embora no final, já com os pés na terra, a sensação seja magnífica e se possa usufruir da experência com a segurança possível de estar no meio da maior favela do Rio. Passado o transe da viagem um olhar para o lado e uma vista alucinante. O Rio aos meus pés, o casario da favela a descer agarrado à encosta íngreme. Ao fundo os prédios, depois o mar, ao lado outros morros. O verde da floresta atlântica que surge pujante no meio da cidade. A favela é favela, mas a vista daqui é de luxo. Caminhamos um pouco rua acima até ao boteco do Belo, se é que isso se pode chamar à garagem com bar, uma mesa de snooker com dificuldade em se manter de pé e duas máquinas de jogos electrónicos. Tomamos um chope e subimos ao cimo do edifício incompleto em cimento para um vista ainda mais abrangente. Muitas fotografias tiradas em plena favela, com uma descontracção que não imaginava possível. Favela é local onde nunca esperei entrar, experiência única e provavelmente irrepetível, no entanto não aconselhável a grande parte das pessoas que conheço.

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